“We are like roses that have never bothered to bloom when we should have bloomed and it is as if the sun has become disgusted with waiting”.

27
Out 09


A solidão.

Aquela solidão.

A que nos assusta e não deixa nada.

É dessa que tenho medo.

Tudo em mim não se profere.

Fica mantido inerte.

Não quero recepção.

Como podemos nós, apercebermo-nos da chegada?

Em tempos idos pensava que era preciso procurar mais longe.

Estou longe e não há nada!

Será isso um sinal da chegada?

Não houve ninguém.

Continuam a ser pessoas de sangue aquelas que me têm.

Já estou noutro patamar.

É fresco.

Ainda estou meio em cima, meio em baixo.

O patamar do silêncio.

A espera evoluiu para o silêncio.

Já sei que hás-de chegar, Senhor do Desterro.

Hás-de cá estar e desferir o golpe em sangue líquido.

E tudo há-de acabar.

E, uma vez na tua casa, jamais direi que sim a outra jornada.


publicado por Ligeia Noire às 22:30

22
Out 09


Prick your finger it is done

The moon has now eclipsed the sun

The angel has spread its wings

The time has come for bitter things 


Marilyn Manson

publicado por Ligeia Noire às 10:58

20
Out 09


Lembras-te de quando éramos pequenas?

Lembras-te de quando éramos pequenas e tudo cabia em caixinhas?

Não é que as caixinhas tenham encolhido, não há é nada para lá guardar.

Lembras-te de quando éramos pequenas e havia detalhes e coisas fortes?

Tão fortes e supremas que derramavam…

Aquele libertador tinha razão "o tempo está a passar cada vez mais depressa".

Não tenho tido forma, não tenho tido ninho.

Ando daqui para lá e espero.

Não que tenha uma cruz inscrita a dizer-me onde anda o tesouro, apenas porque é a única coisa que sei fazer.

Esperar.

Espero, portanto, por nada.

Então não espero!?

No entanto, cá estou eu a esperar.

Não tenho tudo.

Tenho nada.

Nada, não.

Há sempre coisas.

Coisas.

Eu sou a queda ou estou na queda?

Sei, somente, que estou bem com a queda.

Não dá para pensar, para problematizar.

Não há tempo, não há o semelhante.

Já não caibo na caixinha, nem posso ficar fechadinha porque estou demasiado cheia de nada.

 

 II

 

Continuam a andar por aqui.

Quais abutres, em vias de fatigar o estômago.

Vejo-os pelo canto do olho esquerdo e pelo direito também.

O sol está a cozinhar-me.

Dobrar as pernas junto aos braços e querer ser alta.

Ainda bem que continuas a cantar, a tua injecção diária é gratuita.

Não quero atingir o abismo, nem soltar a alma.

Não quero perfazer o corpo, nem ser.

Quero ser castanha.

Fechadinha na sua campânula espinhosa e, quando cair, ser comida sem ter tempo de ver o mundo a atingir-me a carne.

 

publicado por Ligeia Noire às 22:07
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19
Out 09
 

Não me coseste bem.

Doem-me os pontos.

A carne ainda está fresca.

Quero uma solução primordial.

Todos eles foram pequenos, com mãos pequeninas.

Todos eles já foram puros.

Talvez os tenhas cosido melhor do que a mim...

Talvez a carne deles tenha enrijecido mais depressa.

Sinto-me como o Last days do Gus Van Sant.

Não gosto propriamente de Nirvana mas o filme atravessa-me, assusta-me, e repete-se.

Cada vez que a personagem sugada, drenada, maltrapilha descia a encosta, a correr desajeitadamente, e se

embrenhava no bosque… caindo, as costas arqueadas os olhos e o chão...

E fugia

E fugia

Fugia…

Aquelas personagens… invólucros.

Velvet underground soava, e a outra personagem embalava o corpo e acordava a alma:


I am tired, I am weary

I could sleep for a thousand years

A thousand dreams that would awake me

Different colors made of tears


E também se foi embora.

Lá fora, ouvia-se o bosque que prosseguia de verde líquido vestido.

E, o homem de olhos escondidos, havia-se esquecido de tudo.

Dele.

Dos outros.

Da realidade.

Quando se sentou sozinho.

As mãos que dedilhavam a última vontade de querer.

A voz e os acordes.

O cabelo misturado.

O último suspiro de realidade.

Preso.

Liberto pela música.

Não havia horas, divisão de dias, supostas pessoas.

E cantava:

It's a long lonely journey from death to birth

it's a long lonely journey from death to birth

it's a long lonely journey from death to birth

it's a long lonely journey from death to... birth

 

Ficámos assim?

É assim que ficámos quando nos esvaziam?

Em monólogos?

Em passos irreflectidos?

Em vontade de querer afundar e afundar até não sermos avistados...?

Cada um que sabe… adormece à sua maneira.

Eu sei que é um longo percurso.

Eu sei que arde tudo e nada fica…

publicado por Ligeia Noire às 23:37
etiquetas: ,

12
Out 09


Olho em volta de mim. Todos possuem -

Um afecto, um sorriso ou um abraço.

Só para mim as ânsias se diluem

E não possuo mesmo quando enlaço.


Roça por mim, em longe, a teoria

Dos espasmos golfados ruivamente;

São êxtases da cor que eu fremiria,

Mas minh'alma pára e não os sente!


Quero sentir. Não sei ... perco-me todo...

Não posso afeiçoar-me nem ser eu:

Falta-me egoísmo para ascender ao céu,

Falta-me unção p'ra me afundar no lodo.

 

Não sou amigo de ninguém. P'ra o ser

- Forçoso me era antes possuir

Quem eu estimasse - ou homem ou mulher,

E eu não logro nunca possuir!...

 

Castrado de alma e sem saber fixar-me,

Tarde a tarde na minha dor me afundo...

Serei um emigrado doutro mundo

Que nem na minha dor posso encontrar-me?...

 

Como eu desejo a que ali vai na rua,

Tão ágil, tão agreste, tão de amor...

Como eu quisera emaranhá-la nua,

Bebê-la em espasmos d'harmonia e cor!...

 

Desejo errado... Se a tivera um dia,

Toda sem véus, a carne estilizada

Sob o meu corpo arfando transbordada

Nem mesmo assim – ó ânsia! – eu a teria...

 

Eu vibraria só agonizante

Sobre o seu corpo de êxtases dourados,

Se fosse aqueles seios transtornados,

Se fosse aquele sexo aglutinante...

 

De embate ao meu amor todo me ruo, 

E vejo-me em destroço até vencendo: 

É que eu teria só, sentindo e sendo 

Aquilo que estrebucho e não possuo.

 

 

Mário de Sá-Carneiro, Paris, Maio 1913


publicado por Ligeia Noire às 18:47

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