“We are like roses that have never bothered to bloom when we should have bloomed and it is as if the sun has become disgusted with waiting”.

24
Fev 10


Desenrola-se em torno da personagem que dá título à novela.

O cenário é Paris. Sempre Paris.

Já na cidade, Lúcio é introduzido a uma bizarra americana e ao poeta Ricardo por um conhecido de Lisboa.

Um dos auges é pois, a festa que a americana (vemos que o nome desta mulher nunca chega a ser mencionado) realiza na sua magnificente casa.

Somos inebriados pelas descrições de luzes brancas de tal claridade que ofuscam. Perfumes pungentes, uma aura que arrebata a alma. O perfume roxo do ar (…) se de súbito nos arrancassem os olhos, nem por isso deixaríamos de ver. Todo este embrenhado opiáceo de sensações retira ao leitor qualquer sensação de limite corpóreo.

Posteriormente os convidados são presenteados com uma série de bailados voluptuosos e deleitantes. Nesta descrição tudo converge, a carne, a nudez, o desejo insano da alma... A mistura de tecidos e luzes e cheiros musicais conferem uma cadência invulgar ao que poderíamos pensar ser apenas sexual: escoava-se por nós uma impressão de excesso. Sentiam uma ânsia de se suplantarem dos corpos.

Uma orgia dos sentidos todos, um banquete para a alma de quem tem olhos para comer. Olhos devoradores.

Na ressaca da festa, os convidados saem aturdidos. Percebe-se que este momento é a chave do livro.

A essência da personagem é o belo, é a sublimação.

O autor cria um altar onde se apraz.

A partir deste ponto Ricardo e Lúcio tornam-se confidentes. Nasce uma amizade e uma compreensão mútuas. Lúcio sente-se procurado nos recantos ignorados do seu espírito, com tal frase resume-se a percepção do autor quanto à afeição.

Volvidos alguns meses, numa das conversas, Ricardo confessa a Lúcio que não pode ser amigo de ninguém

(…) enquanto eu, por mais que me esforce, nunca poderei retribuir nenhum afecto: os afectos não se materializam dentro de mim (…) só com a minha alma poderia matar as minhas ânsias enternecidas. Só com a minha alma eu lograria possuir as criaturas que adivinho estimar, e assim satisfazer, isto é, retribuir sentindo as minhas amizades.

Eis aqui o segundo ponto-chave da novela.

Alguém que se sente incapaz de corporalizar (literalmente) o que experimenta, sentindo-se culposo.

Poucos dias depois, Ricardo regressa a Lisboa, inexplicavelmente.

Durante o ano que se seguiu a correspondência foi escassa. Talvez Ricardo fugisse dele próprio e Lúcio, era um bocado dele.

Lúcio acaba por regressar também e ao ser recebido pelo amigo este parece-lhe diferente efeminizado, amenizado e esbatido. Podemos então deduzir que aqui ocorreu uma transformação ao nível perceptivo de Lúcio.

Ricardo havia casado com Marta. Uma desconhecida para o amigo.

Aqui o casamento é simbólico, significa unir-se, ter outro tipo de existência, descobrir que a alma é emaranhada.

Marta tem uma presença peculiar e ambígua. Como se fosse um espelho, só tem o lado de fora. O de dentro é embrumado.

Lúcio acaba por envolver-se com ela, não sentindo qualquer melindre quanto a Ricardo, o qual "parece" nem se aperceber.

No desfecho temos um Lúcio furioso com a quietude de Ricardo, acabando por confronta-lo tendo uma sensação de abismo, dedicavas-me um grande afecto; eu queria retribuir esse teu afecto

Laivos de surrealismo. Ricardo criou Marta para poder possuir Lúcio somos nós-dois (…) na hora em que a achei foi como se a minha alma, sendo sexualizada, se tivesse materializado, e só com o espírito te possui materialmente

O amor em que se dá alguém por falta de meios.

E temos um Ricardo que arrasta Lúcio para lhe mostrar Marta. E vamos de encontro à confissão que iniciou o livro: Lúcio encontrava-se preso e só queria contar a verdade inverosímil. Ricardo dispara contra Marta mas afinal só estavam eles os dois no quarto. E quem jazia era Ricardo.

O cárcere pareceu-lhe tempo e bruma.

Será que quando se atinge o auge a vida continua a interessar?

O que vem então a ser a verdade?

Talvez ela não exista, talvez ela seja moldada pelos nossos olhos.

A amizade ultrapassou as fronteiras do real, beleza abstracta que não se pode enlaçar.

A tentativa de concretização é o assunto deste livro.

O que fazemos quando o mundo que trazemos cá dentro não é realizável do lado de fora?

Num escritor como Mário Sá-Carneiro o mundo fica lá fora porque não cabe no livro.

Ele escreve para se expurgar, para se ver, para se compreender.

Talvez com esta obra possamos assimilar que os sentimentos nada têm que ver com os fins, subsequentemente não podemos interpretá-los da mesma forma.

A incapacidade de nos completarmos, de darmos àquele que nos possui a alma, o nosso corpo, é tortuoso. A incapacidade que o livro mostra ser abatida.

Evitar o dano, realizar a alma.

A Natureza não nos ditou regras além daquelas que nos dita o corpo, e algumas não cabem neste mundo.

 

A confissão de Lúcio de Mário Sá-Carneiro

 

publicado por Ligeia Noire às 16:15

18
Fev 10


Sonhei que descia uma escadaria, do género industrial, com duas pessoas desconhecidas.

Depois, já na subida, à medida que chegávamos a um patamar, este apresentava-se sob a forma de um alçapão e ia ficando imerso em água.

Tinha que subir a correr desenfreadamente.

Os últimos patamares estavam já completamente inundados e eu tinha de suster a respiração e submergir para emergir… quando cheguei ao final, só via uma enorme extensão de água, como se fosse um grande lençol.

Durante todo o percurso fazia noite (ou não havia sol, ou dia...) completamente breu!

Não havia nada.... nada... como se fosse o Génesis.... água e escuridão.

publicado por Ligeia Noire às 14:41
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15
Fev 10


Quando vens, todas as brechas se preenchem.

Como se ingerisse dimetiltriptamina passo para o teu lado, aí onde descansas, até que todos nós tenhamos os olhos abertos.

Às vezes, a linha fica tão ténue que te sinto excessivamente cá dentro, até doer de sufocação.

Mas quando fico assim, tão inerte, tão por ti perfeita, não há nada que me atormente, nada que avassale o meu estado letárgico.

Não existem pessoas, nem coisas mundanas que somente de as pensar conspurco estas linhas que te escrevo.

Há coisas que estão destinadas a acontecer e acredito que quando souber o que há aí irei conseguir falar a tua língua e ver-te os olhos.

Aquela noite de bancos frios.

Aquela noite na cidade perdida onde me fechei e inalei a treva.

Talvez tenha atravessado… talvez tenha realmente atravessado.

Por que é que tudo o que quero não existe?

Por que raio tu não existes?

Não quero procurar mais… não quero, senão os teus cabelos longos, os teus olhos de portões seculares e as tuas mãos de serafim.

Não quero prosseguir com a vida cá em baixo.

O peito está constrangido e às vezes respiro-te tanto que preciso de tempo para respirar.

Apareces assim… apareces do nada e sinto-te eterno e enraizado em tudo o que sou.

De onde vieste tu que ninguém vê senão eu?

Tu és e eu ainda não me sou.

Ó Sagrado Cavaleiro do Escolhido, não me abandones!

Leva-me e esconde-me num lugar onde não haja tempo.

  

publicado por Ligeia Noire às 12:56
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07
Fev 10


Olhos fechados, corpo e alma... não sei dizer o que senti.

Só sei que não quero voltar para o mundo... quero continuar a sentir-me "closer and closer"

 

Last exit for the lost

 

Would you pay life's pleasures to see me
Does it hurt for I want you to remain
I run your hair through in another decade
Sumerland holds me in sumerian haze

Pain in places where the lovers mourn
Arranging the play things up and down the hall

Forever remain for every day
My honour remains
Forever remain

Between the spaces along the wall
Appearing faces that disappear at dawn
We're getting closer I can see the door
Closer and closer Kthulhu calls

Forever remain
Forever remain

You'll seek it it'll take a while
You'll seek this if it's a thousand miles
Take what fate brings eternal and desire
I'll change those faces then I take their smile

We're getting close to you I can see the door
Closer and closer or is it there at all

Forever remain
Forever remain

This could be my last regress
Last exit for the lost
This could be my last regress
Last exit for the lost
This could be my last regress
Precious for the lost.

 


Lyrics by Fields of the Nephilim/Letra da autoria de Fields of the Nephilim

 

publicado por Ligeia Noire às 23:33

06
Fev 10


As vezes o tempo pára e começas a aparecer devagarinho.

E pedes-me que te alcance e te olhe por dentro, como se fosses um copo de vidro.

Estou enamorada de um conjunto de fantasmas, crio tudo aquilo que não existe.

O cansaço e a violência às vezes dão lugar a isto.

E todos os locais me enfastiam e tudo me parece remoto e desnecessário e todas as coisas são parte do meu cavaleiro utópico.

O ar fica encalhado no meio da garganta e, de tanta impossibilidade, ao chegar a este mundo só me apetece volver.

Grades e grades e mais grades com correntes.

Desespero.

As paredes do quarto apertam-se e de repente são as costelas que sinto apertadas impedindo o sangue de se prolongar no peito.

Sinto o corpo contraído e náuseas e vertigens e a respiração descompassada.

Só me apetece gritar, partir tudo.

Como se estivesse a sufocar de impossibilidade.

Gostava de poder fechar-me numa canção.

Não queria ter de sentir esta insuficiência de vida.

É o que dá viver ao género da Alice no país das wonderlands.

Só vivo realmente na minha cabeça.

Rejeito tudo porque nada me absorve, satisfaz, extasia como aquilo que moldo cá dentro.

Assim é.

 

publicado por Ligeia Noire às 14:12

04
Fev 10

 

Obrigada!

publicado por Ligeia Noire às 15:14

02
Fev 10


Prick your finger it is done

The moon has now eclipsed the sun

The angel has spread its wings

The time has come for bitter things

   

I

   

Sempre que há algo para ser decidido, podemos usar de desculpas para nos enovelarmos perante a conduta:

"Ainda falta isto e aquilo e aquele outro, depois penso, depois decido depois faz-se, depois aplico-me, depois vivo realmente."

Quando o nevoeiro se dissipa, aí ficamos desnudos… sem amarras perante o caminho que escolhemos e que se abre, imperialmente, à nossa mercê.

O que se pode fazer quando se está, supostamente, naquilo a que nos conduzimos?

Não.

Não foi Deus, não foi a Mãe-Terra, não foi ninguém, senão a nossa pessoa, a maior condicionante, a mais forte vela, a abrir-se ao vento em alto-mar.

Lugar correcto, lugar hierárquico, lugar de futuro, lugar do supostamente.

"Não há outra saída, não podes esconder-te num bugalho, ei! Abre-te!".

Aquilo que mais violentamente abjuro, é esta sensação que me empola a alma.

Esta coisa que rebenta em mim sempre que me estabeleço.

Se é o que não quero: martirizo-me.

Se é o que supostamente me satisfaria: os defeitos eclodem.

O medo toma a face, do que no primeiro caso seria desgosto e frustração, para o "continuar no sacrifício".

Esta constante perda, insatisfação.

Esta prolífica sensação de derrota, de desterro.

Como se tudo fosse sempre nada, não importando o quão muito me fosse disposto.

Essa constante irrealização é-me tão nata, tão intrinsecamente sulcada no sangue que, muitas vezes, o asco que sinto dela ultrapassa a minha capacidade de aversão e passa somente a violência. 


      

II

 

 

Às vezes, sento-me no musgo por trás de casa e a vontade do nada é tão absurdamente imensa, que fico tempo incontado a aquecer o sangue liso.

O corpo fica ali, à luz do sol invernal, qual lírio esfomeado, a manhã toda.

E, em vão, procuro pela vontade, pela ambição, pela criatividade… pelo querer.

Mas, em deliciosa e lenta desvontade, (como se na realidade da minha alma o meu corpo fosse outro ser, o qual se distancia milhas de mim, impedindo a aproximação pela mísera culpa) nada encontro.

Sim!

É apenas por responsabilidade e culpa que me movo em direcção a ela.

Não a posso deixar a cargo de mim!

Se a minha alma ficasse no comando… ah! Que esfarpada seria a escadaria…

Quantas farpas não me rasgariam as unhas...

Ó Senhor da Luz completa, não posso!

Não posso porque ela mataria a minha temperança, extinguiria todo o meu esforço vidral.

Esforço esse, que aglomerei todo este tempo na crença de que -eu e eu- ainda possamos ser nós!

Corpo junto. Alma ligada.

...porque no lamaçal que me cobre, eu sei o quão egoísta, narcísica e egocêntrica sou.. ao ponto de nada me interessar, ao ponto de que tudo o que me interessa ter de a mim estar ligado pelo inquebrável.

Todo o resto não me alcança. Todo o resto que se atravessa no meu caminho lentamente se esvai de aborrecimento e leve candura.

Ou então em luxúria de fantasia a prazo.

No fundo…

Eu

Tu

Ele

Ela

Nós

Vós

E eles sabemos o quão inútil é viver.

Tudo o que criamos, descobrimos, prezamos, abrasamos, matamos é reduzido a reminiscências que se esfarpam até os vermes devorarem e regurgitarem o que resta no cenáculo.

Toda a intelectualidade dos cinco mundos não sacia a existência.

Eras de individualismo exacerbado.

O tão diferente que se tornou tão repugnantemente igual.

Ah, a repugnância!

A única coisa que vale por tudo, é uma lareira magistral sob um luar de Inverno.

 

publicado por Ligeia Noire às 11:50

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