“We are like roses that have never bothered to bloom when we should have bloomed and it is as if the sun has become disgusted with waiting”.

26
Fev 13

 

Um dia falo só deles mas não hoje, estes cavalheiros misturam-se com muito do meu miolo, são do âmago, os primeiros, os que trouxeram a minha primeira amizade a sério, os que fizeram com que ponderasse a minha nuca marcada numa mistura do princípio do mal no ventre do bem.

Cresci com eles, apoiei-me neles, dancei ao som deles, pronto sabes como é, os músicos de base, os que vêm do jardim do Éden passam sempre para o lado de cá e fazem parte das memórias, dizer que são mais do que música é néscio porque música é mais do que tudo.

A primeira vez que bebi a sério, foi sozinha e aos dezoito anos, até aí nunca me apeteceu e, apesar das comuns incursões no vinho tinto aquando da minha meninice, fruto da tradição, não prosperou.

Lembro-me dessa primeira vez aos dezoito anos, lembro-me de estar a arrumar a sala e me sentir do lado de lá, foi com vinho do porto, esse esteve sempre ligado às minhas mais estouvadas memórias.

Continuo a não gostar de beber, um copo de vodca não me sabe tão bem quanto um copo de água, uma cerveja não é tão boa quanto uma malga de cevada mas, como explicar, há qualquer coisa de bom e de enfeitiçador no travo amargo e forte e violento e arrebatado do álcool que nos faz repetir o gole e, claro, há o efeito, eu não bebo por prazer, não bebo diariamente, nem semanalmente mas quando bebo, presto homenagem a Baco de joelhos.

Não sei porque estou a falar nisto, se calhar é por estar a ouvi-los, se calhar é porque não consigo dormir, se calhar é porque estou com medo de que esta coragem toda passe, se calhar é porque a vida é uma merda, mas isso já o mais tenro petiz atingiu.

Escreveu-me, não me disse que o tinha feito, aquela letra cursiva, elegante, que custa a ler mas que vale a pena como uma boa bebedeira.

Não falou de mim, nem de nada, falou de montes e florestas no Inverno, da nevasca, de lobos, de Nova Inglaterra e dum escritor que não recordo, tenho medo, agora, mas ao lê-lo, sem a cabeça desperta, sorria e sentia a sacarina a encher-me as veias, ah sim, os pinheiros mansos, muito altos também lá estavam.

O cheiro, eia pois... o cheiro do papel não era o cheiro comum de folhas de papel brancas, era o cheiro dele, ainda estava por aqui algures nalguma sinapse e levei a carta ao nariz várias vezes e lembrei-me daquela vez em que estava no autocarro e senti o perfume da flor-selvagem, fiquei aturdida porque era como se ele tivesse acabado de entrar.

O efeito foi alucinatório e assustador porque o aroma perpassava pelas minhas narinas e era mais acutilante do que o que a reacção de qualquer outro sentido fosse capaz de causar, assustei-me.

O olfacto sempre foi o meu sentido mais apurado, não uso perfume, acho que o cheiro do sabão, do champô, do amaciador já são suficientes e apaixono-me com os olhos fechados por malmequeres bravos brancos e minúsculos, aquelas folhas verdes deles que parecem funcho em miniatura, tenho medo de não conseguir suster esta força de vontade por muito tempo.

São tão diferentes, eles, o cavaleiro e o anti-herói.

A amiga que não cabe aqui, a das linhas acima, disse para abrir a mente, anestesiar a dor de pensar, não sepultar o por acontecer com o meu conhecimento milimétrico de mim mesma.

A carta está ali na gaveta junto das outras, eu gosto dele e ele ama uma de mim.

Lágrimas em cassete, gravadas, que belo título hã?

Sou demasiado compassiva para alterar o curso do rio, compaixão é do que sou feita, mas isso são contas de outro rosário.

 

publicado por Ligeia Noire às 00:30
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21
Fev 13

 

É isso, Venom a rodar na aparelhagem, o Hell gravado com a cortesia dum professor que tive há uns anos e, já agora, para os meus camaradas que sempre atiçavam, não, nunca fui pra cama com o homem mas já se sabe que os apreciadores de música pesada ou obscura se reconhecem como lobos.

Por falar em música, estou a reler o Long Hard Road Out Of Hell, desta feita na língua original e a parte em que ele diz que há coisas que ainda hoje o atormentam em pesadelos, serve-me direitinha, assim como a milhares de pessoas, presumo.

Tenho sonhos que não conheço, de que não percebo a fonte e não sei se estão relacionados com o passado mas há outros, demasiado explícitos, que seria demasiado condescendente da minha parte fingir que não foram semeados lá atrás, o desta madrugada, por exemplo.

Quando era mais miúda, adolescente, tinha nítido o meu final, seria exposição, estás a ver o final dos tempos? A segunda vinda de Cristo à Terra para recompensar os justos e castigar os errantes?

O meu medo não era o de ser castigada, o problema era a minha concepção de Inferno, e, agora que estou a reler este livro… todo este imbróglio que é a religião, enfim todo este temor, este castigo constante que o levava a paranóias de apocalipse, verdadeiro terror, enfim, a minha concepção de Inferno, como ia dizendo, era mais ou menos a mesma, aliás o que me preocupava e acho que ainda me amedronta é o julgamento final.

Imagino um ecrã panorâmico onde todos os nossos silêncios serão apresentados em alta definição para todos aqueles que partilharam a nossa rotina…

Assusta-me, odeio os olhos ali todos, a turba, a alarvidade…

Gosta da minha música tão violenta quanto os meus filmes e isso não significa tremolo picking ou sangue e tripas, respectivamente.

Cada vez é mais notória a paz e o esquecimento que isso me garante.

Eu era longe e infante, não sabia o que era o bem e o mal, se calhar não os absorvi, isto é, como estão concebidos socialmente neste agora.

É curioso perceber que sempre fui mais, do que agora que sou, se calhar o laço branco vem daí.

 

 

publicado por Ligeia Noire às 00:35
música: "Straight to Hell" dos Venom
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19
Fev 13


Apanho-me, ocasionalmente, com aquele sorriso idiótico no rosto desde que ele me disse (e o quê fica aqui no bolso).

Ando a congeminar uma relação nas arestas e furúnculos da do Lord Henry - Dorian Gray ou melhor, a que ficou por acontecer entre o outro Lorde, o real, o de terra nenhuma e a empregada do restaurante, sim essa é mais plausível, afinal de contas sou uma mansita e só vou abrir cortinas.

A diferença é que sou mulher, mas Eva também era e Lilith e a Babalon, e tenho o sortilégio involuntário do meu lado.

Então, que me dizes a transformá-lo?

E se eu tentasse?

E se eu fizesse como os punks e os batcavers e adaptasse o que tenho, àquilo que quero?

Seria assim tão ofensivo, imoral, infame?

Eram só uns pozinhos…

E não há nada como experimentar.

Conduzir.

Podia construir-lhe um casulo bonito (nunca para aprisionar mas para condicionar), adicionar-lhe violência, capacidade predatória, ficaria perfeito e podia ser que resultasse e eu finalmente falasse enoquiano sem ter de me aproximar do pó estelar.

Fico toda emborboletada só de pensar no que posso atingir, no perigo do abismo.

Claro que depois ele conceberia uma realidade ainda mais nefasta mas, também, no jardim do início, a serpente só falou, foi a Eva quem comeu e deu a comer…

Quando um não quer, dois não dançam.

 

publicado por Ligeia Noire às 23:16

16
Fev 13


Seven brides serve me seven sins

Seven seas writhe for me

From Orient gates to Rlyeh
Abydos to Thessaly
And Sirens sing from stern
But now I cease to play
For I yearn to return
To woodland ferns
Where Herne and his wild huntress lay

Now the tidal are turning
Spurning the darkness
The great purgations of distinguished tours
Are but stills in time
To the thrill that I’m
Once more
Heading to the bedding
Of her English shores

The wind bickered in Satanic mill sails
Eyes flickered in deep thickets of trees
And mists clung tight in panic to vales
When Brigantia spoke her soul to me

From Imbolg to Bealtaine
Lughnasadh to Samhain feasts
I heard her lament as seasons blent
Together a chimerical beast

Now the tidal are turning
Churning in darkness
The celebrations of extinguished wars
Are but stills in time
To the chill that climbs
Once more
Dreading the red weddings
On her English shores

Gone are the rustic summers of my youth
Cruel winter cut their sacred throats
With polished scythes that reap worldwide
Pitch black skies and forest smoke

And the hosts that I saw there
Drones of carrion law
Drove the ghosts of my forbears
To rove and rally once more

One of her sons from the vast far-flung
Come home to rebuild
The rampant line of the Leonine
Risen over pestilent fields

Now the tidal are turning
Burning in darkness
The salivation of her hungry sword
Shalt spill like wine
From the hills to chines
That pour
Spreading her beheadings
On these English shores

For the hosts that I saw there
Drones of carrion law
Drove the ghosts of my forbears
To rove and rally once more

This is a waking for England
From its reticent doze
This is a waking for England
Lest hope and glory are regarded as foes


English Fire by Cradle of Filth/Letra dos Cradle of Filth


Dedicado ao Cavaleiro-das-terras-brancas



Post Scriptum: Cradle of Filth, há uns anos se me perguntasses se gostava deles, provavelmente dir-te-ia que não, num piscar de olhos mas um dia ainda me irei debruçar com os cabelos a acariciarem todo o chão.

Há muitos anos, mesmo muitos, quando a falling nasceu conheci um maluquinho, como diria a mourisca, que era bastante apreciador destes ingleses, foi aí que primeiro ouvi falar de tal blasfémia e não gostei nada.

A voz do Aristocrata Daniel e a mistura exótica de metal negro e gótico estranhava-se pelas minhas papilas gustativas e elas diziam que era intragável.

Hoje, foram eles que me despertaram para mais uma página, pergunto-me o que será feito do neo-gótico maluquinho que cantava cradle…

Apesar de continuar a não ser a minha praia, (sorrio) continuam a pulular de vez em quando por aqui, aliás cheguei a comprar o cd verdinho para os experimentar e acabou por rodar uma ou duas vezes, ontem peguei nele outra vez.

Os senhores que nasceram do berço da imundície, trouxeram uma nova vida a todo um universo sub-cultural que murchava a olhos vistos.

Apesar do termo -metal gótico- se ter tornado tão malfadado, caso estes senhores ou o reverendo, ou os industriais do metal e da pirotecnia germânicos, por exemplo, não se lembrassem de arranjar uma caneta e escrever ou uma palheta e dedilhar a guitarra, ter-se-ia perdido tudo lá nas batcaves do Reino Unido.

Lições preciosas da Senhora de Negro.

Apesar de não ser admiradora da banda, pelo menos por enquanto, dou por mim a ver e ler entrevistas que o Dani-Dani vai fazendo, e é impossível não me sentir fascinada pelo mesmo mundo.

Desde os filmes dos estúdios Hammer, aos vampiros, à literatura gótica, ao Crowley, à demonologia, ao misticismo, paganismo, mas acima de tudo à sábia e muito, muito mas mesmo muito veia gorda e pululante de sarcasmo corrosivo que os diferencia, como diferenciou os americanos Type O Negative.

Tudo se reúne numa festa negra de caracterizações fantásticas, de performances carismáticas, de orquestrações Bachianas, de indumentárias deliciosas, é tudo pensado, arquitectado, delineado ao pormenor e eu gosto ao quadrado disso.

A beleza que se costura, como diria a Dita.

Claro que a marca maior, a característica que os arranca do mar de almas danadas, são os guinchos lancinantes do vocalista que, agora, compreensivelmente, se encontram mais ou menos enferrujados.

A capacidade sardónica de pegar em todos os chavões da subcultura, em todo o ideário da mesma e criar uma nova corrente pejada de bloody kisses, ah Type o negative... She's in love with herself - she likes the dark: fez-se chocapic de chocolate negro.

Aqui o país de brandos costumes chegou mesmo a ser um dos primeiros, senão o primeiro, a recebê-los, o que é extremamente singular, sendo um reduto tão católico temos figuras como os Cradle of Filth, os Marilyn Manson ou o senhor Quorthon a fazerem-nos visitas sumarentas no início dos inícios.

Qualquer adorador do diabo, apenas contactando com títulos tão exortados e sardónicos como: Painting Flowers White Never Suited My Palette, saliva.

Comigo começou com os Type O Negative, só de lhes contemplar os títulos das canções, já a fome me engalanava toda.

Nos Cradle, as letras coroam o monstro e tudo se mistura. As letras…. Já dei por mim a ler o livrinho das letras do disco que tenho e dos que não tenho e é uma riqueza de referências bafientas, autênticos véus de orações profanas e carnívoras, a maior parte dividida em capítulos como se de cantos se tratassem.

 O imaginário de romantismo doente, lascivo e oculto com que eles brincam como crianças esfomeadas é uma preciosidade e puxa-me.

E ainda falta que o The Gospel of Filth: A Bible of Decadence & Darkness, se me venha parar às mãos, curiosa estou, impulsiva sou.

Este meu caderno medicamentoso anda muito musical e remorado, gosto.

Para terminar e ir papar, tenho a dizer que gosto muito desta melodia, muito, tens bom gosto, aliás só podes ter.

Riso escarninho.

 

publicado por Ligeia Noire às 13:06
sinto-me: Vampires, vampires everywhere
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12
Fev 13


Well, here's my new address
6 6 5 oh
I confess
there's all your evidence
now, take it home and fuck with it.



publicado por Ligeia Noire às 22:52
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10
Fev 13


Remember when you were young, you shone like the sun.

Shine on you crazy diamond.
Now there's a look in your eyes, like black holes in the sky.
Shine on you crazy diamond.
You were caught on the crossfire of childhood and stardom, 
Blown on the steel breeze.

Come on you target for faraway laughter, 
Come on you stranger, you legend, you martyr, and shine!
You reached for the secret too soon, you cried for the moon.
Shine on you crazy diamond.
Threatened by shadows at night, and exposed in the light.
Shine on you crazy diamond.
Well you wore out your welcome with random precision,
Rode on the steel breeze.

Come on you raver, you seer of visions, 
Come on you painter, you piper, you prisoner, and shine!

 

Lyrics by Pink Floyd/Letra dos Pink Floyd


Não me esqueci deles.

Tenho estado embrenhada em coisas tão díspares e ando a ler, ei ei ei ando a ler.

Gosto muito desta parte um do crazy diamond, a forma como, da atmosfera estrelada saem –aqueles- acordes de guitarra, sou eu com o Mundo...

Shine on you crazy diamond, brilha e brilha.

Sabes, é como as manhãs odiosas de ressaca de bebidas brancas, é involuntário o desejo de água, do oposto, do fresco e calmo.

Pink Floyd são viajantes, são viajados viajantes no tempo.                          

É por isso que a música é tão difícil de explicar, quando fecho os olhos à artificialidade de compromissos, indumentárias que estão em vias de confecção, de histórias livrescas que leio por curiosidade tonta, fecho os olhos a tudo e brilha luzidio por entre a turvada poeira que aqui claudica.

E as cordas da guitarra fazem-me sentir o mesmo que sinto quando inalo álcool etílico mas dura mais, muito mais e dá-me sustento, como se eu me metamorfoseasse da pedra incolor de quartzo e quisesse brilhar tanto quanto um diamante, louca já sou, falta-me a centelha de coragem para brilhar incessantemente.

Amo-te.

Parecendo franco, o dito.

 

publicado por Ligeia Noire às 12:36

08
Fev 13

 

CYRIL (coming in through the open window from the terrace). My dear Vivian, don't coop yourself up all day in the library. It is a perfectly lovely afternoon. The air is exquisite. There is a mist upon the woods like the purple bloom upon a plum. Let us go and lie on the grass, and smoke cigarettes, and enjoy Nature.


VIVIAN. Enjoy Nature! I am glad to say that I have entirely lost that faculty. People tell us that Art makes us love Nature more than we loved her before; that it reveals her secrets to us; and that after a careful study of Corot and Constable we see things in her that had escaped our observation. My own experience is that the more we study Art, the less we care for Mature. What Art really reveals to us is Nature's lack of design, her curious crudities, her extraordinary monotony, her absolutely unfinished condition. Nature has good intentions, of course, but, as Aristotle once said, she cannot carry them out. When I look at a landscape I cannot help seeing all its defects. It is fortunate for us, however, that Nature is so imperfect, as otherwise we
should have had no art at all. Art is our spirited protest, our gallant attempt to teach Nature her proper place.

As for the infinite variety of Nature, that is a pure myth. It is not to be found in Nature herself. It resides in the imagination, or fancy, or cultivated blindness of the man who looks at her.


CYRIL. Well, you need not look at the landscape. You can lie on the grass and smoke and talk.


VIVIAN. But Nature is so uncomfortable. Grass is hard and dumpy and damp and full of dreadful black insects. Why, even Morris' poorest workman could make you a more comfortable seat than the whole of Nature can. Nature pales before the furniture of "the street which from Oxford has borrowed its name," as the poet you love so much once vilely phrased it. I don't complain. If Nature had been comfortable, mankind would never have invented architecture, and I prefer houses to the open air. In a house we all feel of the proper proportions. Everything is subordinated to us, fashioned for our use and our pleasure. Egotism itself, which is so necessary to a proper sense of human dignity' is entirely the result of indoor life. Out of doors one becomes abstract and impersonal. One's individuality absolutely leaves one. And then Nature is so indifferent, so unappreciative. Whenever I am walking in the park here, I always feel that I am no more to her than the cattle that browse on the slope, or the burdock that blooms in the ditch. Nothing is more evident than that Nature hates Mind. Thinking is the most unhealthy thing in the world, and people die of it just as they die of any other disease. Fortunately, in England at any rate, thought is not catching. Our splendid physique as a people is entirely due to our national stupidity. I only hope we shall be able to keep this great historic bulwark of our happiness for many years to come; but I am afraid that we are beginning to be overeducated; at least everybody who is incapable of learning has taken to teaching, that is really whatour enthusiasm for education has come to. In the meantime, you had better go back to your wearisome,uncomfortable Nature, and leave me to correct my proofs.

 

Post Scriptum: Óscarzito foda-se que filho da puta me saíste, já tinha tido um vislumbre no de profundis, aquilo é demasiado melodramático, apesar das boas ideias que por ali se apanham, a maior parte é demasiado amanteigada, melosa, o amante amargurado, as comadres zangadas, enfim.

Para um dândi, bem que na tua arrogância te deixaste pisotear por um miúdo ranhoso.

Se bem que, na altura, aprendi a aceitar que lá porque não me coaduno com o amor, não tenho o direito de julgar os que ficam sob o seu domínio. 

Mas isto não podia deixar passar em branco, então colocas-me um gajo com nome de gaja, aborrecido que só ele, a mandar bitaites sobre a Natureza?

Mas de que berço de oiro saltou este?

Não consigo ficar calada, não, não posso.

Sei que o ensaio é sobre a arte de mentir, o ardil mas se queres que te diga, nem liguei nenhuma ao teor da cena.

Este Vivian faz-me lembrar os intelectuais da minha última escola, cheios de pejo e arrogância e respostas que nunca mais acabam.

Aborrecidos, laboriosos, artificiais, feios, acima de tudo feios.

Agora a ti, ó texto, a Natureza é mais do que tudo.

É perfeita.

É divina, é misteriosa, insondável, criadora, começo e final, se isto fosse um jogo de submissão, que não é, seriamos nós, sempre, a baixar as costelas.

Sempre achei a arte filha da Natureza, o mais perto que o ser humano conseguiu alcançar da Gaia mas atestar que ela é monótona, incompleta?

Mas algum dia, porventura, conseguiríamos fabricar, um décimo da beleza da urze, numa qualquer pintura, seja ela qual for?

Como pode ser monótona?

Talvez para aristocratas, leitosos e artificiais que perdem a individualidade só porque se misturam na urbe.

Ora, se só sois capazes de tal dentro de portas, toca a laçar a corda.

E sim, ela é cruel, desconfortável e pejada de bicheza preta.

Rua!

Ousar, sequer, que as construções humanas são-lhe equiparáveis é perfeitamente ridículo.

Nada existe de mais sublime do que um ramo de lírios-do-vale, do que um gato espreguiçado ao sol, do que um céu siberiano estrelado, do que a tundra, do que o quartzo, do que água de ribeira, do que carvalhos, teixos, do que munha a atapetar o chão, do que bugalhos, foda-se, assentir que um quadro, uma cadeira estofada, um poema, uma casa vitoriana ou eu sei lá mais o quê se lhe sobrepõe....

Vai lá ao berço procurar o lanho que te deixou assim.

Ela não tem de ser confortável, sabes porquê?

Simplesmente porque não é tua escrava, porque é independente, porque se há cancro no Mundo, se há alguma coisa imperfeita, cimentada, feia, corrupta, somos nós.

Ela não tem de nos apreciar ou agradecer mas de onde caralho tiraram isso?

Para ela não somos mais do que gado diz o Vivian ofendido, olé mas tu achas-te mais do que o gado?

Por que haveríamos de ser, querias sentir-te o quê Vivian?

Querias que tudo se vergasse à tua insuperável presença?

Ainda por cima, tudo o que fazemos é fodê-la mas bem que iremos retornar ao pó e ela há-de cá ficar.

Quanto mais conheço as pessoas mais aprecio os animais, olha que bem que fica aqui este chavão.

Não, não sou pagã, nem hippie, nem wiccan, nem nada, tenho apenas um par de olhos limpos.

Tinha de escrever, tinha de desabafar, senti-me ultrajada, enervada, gosto da tua forma de pensar, gosto do dandismo, da arrogância de ser, da decadência, do prazer no escapismo, do rouxinol da rosa de sangue, do abuso dos prazeres vedados, da luxúria, do sarcasmo, da imoralidade, da brincadeira de brincar mas nunca acima da Natureza, o sagrado contempla-se e não se blasfema, hoje perdeste e não quero saber.

Se a arte lhe está tão acima, então eu odeio tudo o que é a arte, até ao tutano!

E ressalvo a música, puxando-a por um braço para fora da gaveta.

 

 

publicado por Ligeia Noire às 13:10
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05
Fev 13


Anos, anos até descobrir de onde tinha saído a letra para a Östenmarsch, fiquei a saber há uns tempos que seria algo de Jean Genet mas daí até chegar a este texto, ufa rasas de sal mas finalmente encontrei.

Não é o texto trigo limpo, farinha amparo mas melhor só se contactar os autores.

Embora algumas passagens sejam nebulosas e outras faltem, é mais ou menos isto: 

 

You lay covered in those moments

As you do in the morning

When you awake from an agonizing dream

And in the course of detention

You sometimes appeal to the wilderness

To the events which were getting underway when you lost your foot

Events which are like semi-awakenings when at times explode on the surface

(...)

The man I was seeking among other men died in his bed like a royal prince.

Before covering his body with a standard a grace shoed him


By its gentle gesture with a rose clenched in

I recognised a hand lift among the dead

Alone you did what a soldier would not dare do

You now descend with no fear or sorrow.

Black shorts gloved your soul like your body

And when you offended the designated grave

A livid puzzle aligned upon a lightning bolt

Was cut into shapes with the sharp edge of a blade.

 

We saw you arise, carried away by madness

Attached tightly by your hair

To the crowns of iron

In that swirling swastika and that dirty rose

Your arms twisted from being taken alive.

 

So which angel has led you across the solid fields?

Go without stumbling, bending the air with your hands.

A delicate helix in front of a meteor

Thus marking out and destroying... our precious path.


Decifrado com a cortesia da pessoa que se veste com a alcunha de spiritofsacrifice e claro, a letra é da autoria de Douglas Pearce e Erik Konofal.

Tendo sido inspirada/reformulada/glosada do e no poema Marche Funèbre do escritor Jean Genet, especificamente na parte nona:

 

 IX 

L'ENFANT que je cherchais épars sur tant de gosses 
Est mort dans son lit seul comme un prince royal. 
Hésitant sur l'orteil une grâce le chausse 
Et recouvre son corps d'un étendart loyal 
  
A la douceur d'un geste où s'accroche une rose 
Je reconnais la main dévalisant les morts! 
Seul tu fis ces travaux qu'un soldat même n'ose 
Et tu descends chez eux sans craintes ni remords. 
  
Comme ton corps un maillot noir gantait ton âme 
Et quand tu profanais le tombeau désigné 
Tu découpais avec la pointe d'une lame 
La ligne d'un rébus par la foudre aligné. 


Nous t'avons vu surgir porté par la folie 
Aux couronnes de fer accroché par les tifs 
Dans la dentelle en perle et les roses salies 
Les bras entortillés d'avoir été pris vifs. 

A peine revenu nous porter ton sourire 
Et tu disparaissais si vite que j'ai cru 
Que ta grâce endormie avait sans nous le dire 
Pour un autre visage autres ciels parcouru.
  
De ton corps bien taillé sur un enfant qui passe 
J'entrevois les éclats je lui veux te parler 
Mais un geste de lui subtil de lui t'efface 
Et te plonge en mes vers d'où tu ne peux filer.


Quel ange a donc permis qu'à travers les solides 
Tu passes sans broncher fendant l'air de ta main 
Hélice délicate à l'avant d'un bolide 
Qui trace et qui détruit son précieux chemin? 

Nous étions désolés par ta fuite légère. 
Un tête-queue brillant te mettait dans nos bras. 
Tu bécotais nos cous et tu nous voulais plaire 
Et ta main pardonnait à tous ces cheveux ras. 

Mais tu n'apparais plus gosse blond que je cherche. 
Je tombe dans un mot et t'y vois à l'envers. 
Tu t'éloignes de moi un vers me tend la perche. 
D'une ronce de cris je m'égare à travers. 
  
Pour te saisir le Ciel fit de sublimes pièges 
Féroces et nouveaux œuvrant avec la Mort 
Qui surveillait du haut d'un invisible siège 
Les cordes et les nœuds sur des bobines d'or. 

Il se servit encor du trajet des abeilles 
Il dévida si long de rayons et de fil 
Qu'il fit captive enfin cette rose merveille: 
Un visage d'enfant qui s'offrait de profil. 
  
Ce jeu s'il est cruel je n'oserais m'en plaindre 
Un chant de désespoir en crevant ton bel œil 
S'affola de te voir par tant d'horreur étreindre 
Et ce chant pour mille ans fit vibrer ton cercueil. 

Pris au piège des dieux étranglé par leur soie 
Tu es mort sans savoir ni pourquoi ni comment. 
Tu triomphes de moi mais perds au jeu de l'oie 
Où je t'ose forcer mon fugitif amant. 
 
Malgré les soldats noirs qui baisseront leurs lances 
Tu ne peux fuir du lit où le masque de fer 
T'immobilise raide et soudain tu t'élances 
Retombes sans bouger et reviens en enfer. 
 

No mesmo sítio existe uma tradução em ingês feita pelo senhor Mark Spitzer


       IX 

  
THE CHILD I was seeking
scattered among so many kids 
is dead in his bed, alone 
like a royal prince. 
Hesitating on his toe
a grace shoes him 
and covers his body 
with a royal flag. 
  
In the sweetness of a rose-holding gesture 
I recognize the hand plundering the dead! 
A soldier would never do 
the deeds only you do
and you descend among them 
with neither dread 
nor remorse. 

Like your body
a black undershirt gloved your soul 
and when you profaned against the designated tomb 
you carved with the point of a blade 
the figure of a rebus 
aligned by lightning. 
  
We have seen you rise, carried by madness 
hanging by your hair
to the crowns of iron 
in pearly lace and roses soiled 
arms twisted from being seized alive. 
  
Barely returned to bring us your smile 
you disappeared so quickly I believed 
that without telling us, your sleeping grace 
wandered other skies for another face. 
  
On a passing child I glimpse
flashes of your well-built frame 
I wish to speak to you through him 
but a subtle gesture from him 
makes you fade from him 
and plunges you into my verse 
where you cannot escape. 

Which angel then permitted you to pass 
unflinchingly through matter 
cleaving the air with your hand 
like the delicate whirl at the tip of a missile 
tracing and destroying its own precious path? 
  
We were desolated by your narrow escape. 
A brilliant tailspin placed you in our arms. 
You pecked our necks and wished to please us 
and your hand was forgiving 
to all these shorn hairs. 
  
But you no longer appear, blond kid whom I seek. 
I tumble in a word and see you in reverse. 
You move away from me, I am saved by verse. 
Through a bramble of cries I lead myself astray. 
  
To seize you the Sky set subtle traps 
ferocious and new, in league with Death 
watching from the top of an invisible throne 
the cords and knots on bobbins of gold. 
  
The Sky even used the passage of bees 
unwinding so many rays and so much thread(1
that he finally made captive this rosy marvel: 
a child's face offering itself in profile. 
  
If this game is cruel I wouldn't dare complain 
in bursting your beautiful eye
a song of despair went mad to see you 
embraced by so much horror 
and this song, for a thousand years 
made your coffin tremble. 
  
Caught in the snares of gods, strangled by their silk 
you are dead without even knowing why or how. 
You triumph over me 
but lose at the game of the goose
where I dare to rape you
my fugitive lover. 
  
In spite of black soldiers who will lower their lances 
you cannot flee from the bed where an iron mask 
pins you rigid -- but suddenly you spring forth 
fall back without moving
and return to hell.

 

publicado por Ligeia Noire às 12:49
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04
Fev 13


Estás a ver aquele videoclip dos Gojira em que a miúda arrasta um caixão através de uma corrente que lhe sai do umbigo?

Bem, foi o que fiz com tudo o que está aqui e espero que a caída fique protegida dos salteadores nesta fundura desmedida.

É que todas as palavras que aqui escrevo, neste meu caderno medicamentoso, são mesmo aquilo que quero dizer, toda a simbologia entrelaçada faz amor com os desenhos alfabéticos e dá à luz a criação.

Tudo faz sentido, nada em mim é por acaso, nada aqui é por acaso.

Espero, assim, que os decalcadores não se lembrem de que os vales podem ser fundos e que os silenciosos de sempre encontrem o caminho.

Ontem, o argonauta trouxe o Baudelaire, só lhe conheço poemas avulsos e os paraísos artificiais, hei-de lê-lo com calma porque, mesmo estando a ser declamado em português, houve um clique imediato e ao ouvir o nome do autor, sorri no escuro.


Je t'adore à l'égal de la voûte nocturne,
Ô vase de tristesse, ô grande taciturne,
Et t'aime d'autant plus, belle, que tu me fuis,
Et que tu me parais, ornement de mes nuits,
Plus ironiquement accumuler les lieues
Qui séparent mes bras des immensités bleues.

Je m'avance à l'attaque, et je grimpe aux assauts,
Comme après un cadavre un chœur de vermisseaux,
Et je chéris, ô bête implacable et cruelle!
Jusqu'à cette froideur par où tu m'es plus belle!


Charles Baudelaire


E por falar em franceses, sonhei com a rapariga limpa, a dos maravilhosos cabelos de trigo, queria tanto ter arriscado, achas que ela teria parado de florir, esconderia o azul dos olhos, a voz pequenina?

Sei que gostará de coisas mais solarengas e saudáveis mas desde que lhe lacei um vestido feito à pressa com fitas roxas, a liberdade tomou-me à força e contemplei-lhe as pestanas, intimas guardiãs de pedras jacintinas.

És toda o contrário da noite, és toda raios e limpeza e vontade e espontaneidade e afabilidade.

Meu mais belo narciso fulvo derramado na imensidão azul deste meu receptáculo de tristeza.

Ficas tão bem no meio de todas estas palavras, gostei de começar contigo.

 

publicado por Ligeia Noire às 16:05
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