“We are like roses that have never bothered to bloom when we should have bloomed and it is as if the sun has become disgusted with waiting”.

26
Fev 13

 

Um dia falo só deles mas não hoje, estes cavalheiros misturam-se com muito do meu miolo, são do âmago, os primeiros, os que trouxeram a minha primeira amizade a sério, os que fizeram com que ponderasse a minha nuca marcada numa mistura do princípio do mal no ventre do bem.

Cresci com eles, apoiei-me neles, dancei ao som deles, pronto sabes como é, os músicos de base, os que vêm do jardim do Éden passam sempre para o lado de cá e fazem parte das memórias, dizer que são mais do que música é néscio porque música é mais do que tudo.

A primeira vez que bebi a sério, foi sozinha e aos dezoito anos, até aí nunca me apeteceu e, apesar das comuns incursões no vinho tinto aquando da minha meninice, fruto da tradição, não prosperou.

Lembro-me dessa primeira vez aos dezoito anos, lembro-me de estar a arrumar a sala e me sentir do lado de lá, foi com vinho do porto, esse esteve sempre ligado às minhas mais estouvadas memórias.

Continuo a não gostar de beber, um copo de vodca não me sabe tão bem quanto um copo de água, uma cerveja não é tão boa quanto uma malga de cevada mas, como explicar, há qualquer coisa de bom e de enfeitiçador no travo amargo e forte e violento e arrebatado do álcool que nos faz repetir o gole e, claro, há o efeito, eu não bebo por prazer, não bebo diariamente, nem semanalmente mas quando bebo, presto homenagem a Baco de joelhos.

Não sei porque estou a falar nisto, se calhar é por estar a ouvi-los, se calhar é porque não consigo dormir, se calhar é porque estou com medo de que esta coragem toda passe, se calhar é porque a vida é uma merda, mas isso já o mais tenro petiz atingiu.

Escreveu-me, não me disse que o tinha feito, aquela letra cursiva, elegante, que custa a ler mas que vale a pena como uma boa bebedeira.

Não falou de mim, nem de nada, falou de montes e florestas no Inverno, da nevasca, de lobos, de Nova Inglaterra e dum escritor que não recordo, tenho medo, agora, mas ao lê-lo, sem a cabeça desperta, sorria e sentia a sacarina a encher-me as veias, ah sim, os pinheiros mansos, muito altos também lá estavam.

O cheiro, eia pois... o cheiro do papel não era o cheiro comum de folhas de papel brancas, era o cheiro dele, ainda estava por aqui algures nalguma sinapse e levei a carta ao nariz várias vezes e lembrei-me daquela vez em que estava no autocarro e senti o perfume da flor-selvagem, fiquei aturdida porque era como se ele tivesse acabado de entrar.

O efeito foi alucinatório e assustador porque o aroma perpassava pelas minhas narinas e era mais acutilante do que o que a reacção de qualquer outro sentido fosse capaz de causar, assustei-me.

O olfacto sempre foi o meu sentido mais apurado, não uso perfume, acho que o cheiro do sabão, do champô, do amaciador já são suficientes e apaixono-me com os olhos fechados por malmequeres bravos brancos e minúsculos, aquelas folhas verdes deles que parecem funcho em miniatura, tenho medo de não conseguir suster esta força de vontade por muito tempo.

São tão diferentes, eles, o cavaleiro e o anti-herói.

A amiga que não cabe aqui, a das linhas acima, disse para abrir a mente, anestesiar a dor de pensar, não sepultar o por acontecer com o meu conhecimento milimétrico de mim mesma.

A carta está ali na gaveta junto das outras, eu gosto dele e ele ama uma de mim.

Lágrimas em cassete, gravadas, que belo título hã?

Sou demasiado compassiva para alterar o curso do rio, compaixão é do que sou feita, mas isso são contas de outro rosário.

 

publicado por Ligeia Noire às 00:30
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