Antes de mais deixa-me frisar o quão genial é o Lost, moving on...
Trabalhar é uma merda mas dá-nos uma certa paz de espírito, uma espécie de validação. Estou fodida, tenho os músculos em fermentação e para variar doem-me as costas mas sinto-me calma, o que é bom, poderia continuar nisto mas como já reparaste não gosto de falar desse tipo de coisas aqui.
Estas coisas mundanas, per si, emporcalham isto tudo, não quero falar daquelas pessoas, ou daquele trabalho, ou do estado da nação, ou et cetera e tal porque são coisas sujas, inúteis, quanto muito falo do que me despertam ou do que vão causando por aí.
Estou a ouvir uma canção chamada Limit to Your Love de um tal de James Blake que nunca vi mais gordo, acho que já tinha ouvido isto na rádio, sonicamente lembra-me uns Massive Attack, com as devidas ressalvas, e em termos vocais uma mistura da voz do Callier e do Antony Hegarty sim, Primavera Sound effect.
Andei a averiguar as actuações dos Dead Can Dance, do Nick Cave e as suas más rezes e dos My Bloody Valentine, sei que provavelmente gostaria de Swans mas nunca tive tempo de ouvir, parece ridículo, mas é verdade.
É preciso tempo e espaço e fiquei-me por este James Blake como pano de fundo desta missiva.
Há flores na mesa, vermelhas, estranhas, não lhes sei o nome.
Há flores na masseira, amarelas, um grande ramo, giestas.
O sol está espalhado lá fora, o vento faz-me frio.
Havia do que falar mas não dá ainda.
Sabes aquele elefante sentadinho no meio do recinto que se ignora?
Ora aí está, não me apetece reparar nele, até porque gosto de falar das coisas com distância, de anos, por vezes.
A minha prima falou ontem com entusiasmo da sua primeira sobrinha, frisando o quão bonita e blá, blá, blá era.
Acho que a minha expressão fechada e o ter-lhe dito que tenho três e só conheço e gosto de um, lhe fechou a matraca e me deixou em paz para continuar a cantarolar a droga perfeita.
Poderias dizer que foi por causa da recente notícia que lhes voltei mas, para além de nunca ter saído deles, esse desejo, curiosamente, tinha-me visitado há uns dois dias.
Eia! O sexto sentido feminino.
Eu sei que ele não gosta da canção, nem do teledisco mas foda-se ó Trent, não te entendo, há lá coisa mais perfeita?
Gosto de muitos telediscos, aliás entre os meus preferidos e mais criativos e engenhosos estão os dos N.I.N. e os dos Marilyn Manson.
Mais recentemente lembro-me daquele da Fjara dos Sólstafir que conheci depois do Vacuity dos Gojira mas este Perfect Drug fala-me ao negro.
Desde o casaco comprido, às asiáticas de cabelos de azeviche, aos três senhores de cartola, ao absinto, à criança, ao jardim à la The Shining, à casa, a cada movimento de cabelo, culminando, pois está claro, na letra.
Enquanto o cavaleiro conta os dias para Julho eu vou ficando com o pêlo eriçado.
E dizia a minha prima «ah estás apaixonada», eu apaixonada?
Já disse que se fosse o oposto eu não o faria por ninguém…
«Ah isso foi porque ainda não te apaixonaste», eh pá se ainda não me apaixonei e tenho estes anos, parece-me que isso não vai acontecer, nem eu preciso que aconteça, se o verbo apaixonar nasceu da palavra paixão, passio, então sim paixões ah e tal, conversa do outro dia, eu apaixono-me sim mas amor não.
Amor não seria assim mais parecido com o que se sente por pais, irmãos e amigos do peito?
Dar a vida, estar ali sem preocupações de postura?
Ora nunca senti nada de tão forte, nem nunca senti esse descomprometimento e já estou farta de falar disto mas a puta da conversa há-de dar sempre ali e, momentaneamente, vejo-me rodeada de amanteigados, outra vez.
Mas ela, chata como o caralho, volta a dizer «ah cala-te tu gostas dele», claro que gosto dele, gosto dele, muito talvez?
Mas não lhe chames amor, sabes em quantas cenas me meti desde que ele foi, claro que não foram namoros, talvez affairs mas nem sei se isso serve para explicar... eu não tenho namorados, mas isso não lhe disse porque ela não iria perceber.
Acho que se estivesse apaixonada, não teria essa despreocupação, pelo menos até acabar a paixão.
Aliás, até lhe poderia revelar que ela não está apaixonada pelo namorado mas poderia pensar que estava com ciúmes e no final de contas há-de acabar por perceber por si e continuar com ele porque ah e tal chama-lhe amor, eu chamo-lhe segurança, ou pior a sobranceria de ter um gajo ao lado, um anel de compromisso no dedo, uma saída a quatro num Domingo, um almoço em família onde se apresentam mutuamente, ah vou ali vomitar e já venho.
Ya dezoito anos que eu tenho.
Aliás, deveria utilizar-se a palavra enamoramento porque é de amor que falam estas almas sábias, certo?
Deveriam dizer: estou enamorada e não apaixonada e, então, eu já poderia confirmar que me apaixono... uma vez por mês pelo menos.
É como a palavra amante... ai os caminhos que as palavras tomam, dariam teses e teses se eu não achasse todo o trabalho trabalhoso.
A última vez que sofri por alguém, e se calhar a única, foi pela minha melhor amiga.
Melhor?
Sofrer mesmo, tipo ah e tal bebi para ai umas trezentas cervejas porque não havia dinheiro para vodca e chorei no ombro de outra menina, tudo isto porque ela pensou que eu estava apaixonada por ela e ficou magoada.
Ora, no meu entender de leiga sobre estas coisas do amor acho que, para que isso sucedesse, eu teria de sentir vontade de a foder, de beijá-la mas para além de nunca ter sentido atracção alguma, ela estava tão longe de fazer o meu género, como o James Blake de fazer parte da minha playlist.
Resumindo, até a mim ela me deixou confusa e a fazer exames de consciência, acho que foi por gostar tanto dela que a perdoei mais tarde mas, como em tudo o que se escangalha, a perfeição foi-se e usou-se cola.