“We are like roses that have never bothered to bloom when we should have bloomed and it is as if the sun has become disgusted with waiting”.

16
Mai 12


E digo-me, não escrevas porque hoje não é remédio.

Já se sabe que é tudo sujo e podre.

E continuas a contornar o poço, assim não vale a pena, não podes construir uma casa em cima da que já existe.

Como se acordasses num quarto tomado pelo fogo e não fosses capaz de o apagar, assim como de chamar por auxílio.

Não podes mostrar o que está lá no fundo e como não o mostras pagas por isso, tens de te comportar como se tivesses um prato de porcelana inteiro, como se tivesses começado pela primeira caleira quando nem sequer havia por onde subir.

Habitua-te porque tudo fica sempre pior, se calhar até tu Supremo, até tu te irás.

É que teceste o meu carreiro com tantas malhas, tantas… às vezes acho que não gostas de mim duas vezes.

Há uns dias acordei sem saber onde estava nem que dia era, foi preciso correr um pouco a cortina para reconhecer o hospício.

E vou continuar a fazer ninho à volta do incêndio.

Não esperes mais de mim no que diz respeito a este eterno rosário porque nada dele posso desfiar aqui, oxalá fosse poetisa ou pintora para compor o ramalhete em tons cerrados, oxalá fosse feliz e a filha negra não existisse e não precisasse, constantemente, de escrever.

Oiço uma das novas canções dos Anathema. A dado momento a voz feminina entoa:

Why I should follow my heart?

Não, não há porque seguir o coração, aliás, a emotividade é um belo dum entrave.

Agora que penso nisso… tive um namorado que, a páginas tantas, me acusou de ser fria, não percebi um caralho do que ele quis dizer com aquilo, pois não me fazia sentido, mais um cravo no caixão branco, mais um que não fazia a mínima ideia de quem era aquela rapariga para quem estava a olhar.

Se queria dizer que os meus olhos só brilhavam quando ia para o campo, quando ouvia, tinha e entrava na minha música, quando tinha dinheiro, quando os arbustos floriam pelas ruas ou quando provei vodca finlandesa na tasca da rua... com as moças de... da cidade, de... Então entendo e assinto.

Nunca pedi desculpa porque tenho o símbolo dos quatro cantos bem visível.

Nunca fui feliz por andar de mão dada, mas já fui feliz quando me ofereceram a poesia do Mário de Sá-Carneiro completa, quando atei um cordel azul na sapatilha de uma rapariga de olho azul, quando comprei o meu primeiro disco da Diamanda Galás, num sítio que, ainda por cima, estava a passar um tema de Suas Majestades Infernais, ou em todas as vezes que ando à chuva, a sério.

Quando provei o mar de Inverno com a-rapariga-que-tem-nome ou, ainda, quando descobri que há flores que ao invés de se deixarem colher nos ceifam para si.

Meio caminho andado para a felicidade, se se souber que ela é fragmentada e de instantânea compleição, assim como o leite com chocolate em pó.

Por falar em chocolate, sinto-me feliz sempre que sei ter quatro ou cinco tabletes guardadas.

Sou feliz numa hora, sou feliz pelas coisas e pelos instantes, a felicidade não dura mais do que uma rosa em flor.

publicado por Ligeia Noire às 03:00

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