“We are like roses that have never bothered to bloom when we should have bloomed and it is as if the sun has become disgusted with waiting”.

02
Mar 14

 

 

Escrever a sério, aqui, já não o faço há uns meses e, quem diz a sério, diz escrever sobre mim e eu e a jornada do mim e do eu pelo infinito dos dois lados da moeda.

Vou aproveitar que estou sozinha para te actualizar no balancete deste mês.

 

Oiço ††† e gosto muito e talvez devesse ter posto a roots, bloody roots para se coadunar com a dissimulação de meia-noite que me tem cansado as retinas de ambos os olhos e os neurónios de um só cansado cérebro.

 

 I

 

Ora, que o conhecimento não nasce de geração espontânea já todos sabemos, que não há nada de novo debaixo do sol mas apenas o reinventar do já inventado também mas o aproveitamento da mão que alimenta, de quem desviou a cortina do sol, do suga, suga, vá lá suga do corpo suculento até não servir mais qualquer propósito, abana-me aqui qualquer coisa por dentro, causa-me um certo nojo que consegui, até agora, conservar na maturidade e na desvontade de me preocupar com petizes que nada sabem de ter fome.

Acontece que já ultrapassou o limite do aceitável e, não é que vá fazer muito, mas pelo menos escrevinhar aqui perfaz um propósito jeitoso.

Uma vez que, os abutres são prolíferos em detectar carne podre e, em último caso, abre-lhes o apetite para tentarem o exame de consciência.

Não há nada de mal em ser-se cá fora quem se é no resguardo do quarto.

Mas ser-se a sério, não fingir que se é sob uma máscara de vida espinhosa e negra.

Há o aproveitar de oportunidades, o recolher de informação, o descobrir e o abrir alas à genuína vontade de querer saber e, depois, há a vampirização da carne tenrinha e disso… eu não gosto.

Ah Supremo… como aprendi com tudo o que podia arrastar para a minha beira, como desbastei o caminho sozinha, sem ter quem me mostrasse aquilo que valia a pena, quanto tempo perdi em coisas inúteis, pessoas inúteis, caminhos infrutíferos mas a vida é sábia e aprende-se com o analfabeto e com o douto, aquilo que somos capazes de receber, diga-se.

Cadernos e cadernos que escrevi…

Hoje pouco escrevo à mão, a não ser cartas para amantes e amigos e até essas raras se tornaram… mas escrevia e foi assim que aprendi a desatar os atilhos à alma.

Não havia words ou googles para nos mostrarem sinónimos elaborados, frases barrocas, last fm’s que nos sugerissem bandas similares e me cultivassem a alma à pressão, quanto mais bibliotecas ou dinheiro para livros ou, ainda, pessoas à minha volta que me inspirassem a vontade de as descobrir, bem dizia a senhora de negro que as almas dos iguais nunca estariam perto, que teríamos de procurar e procurar e assim foi…

Porque em mim sempre houve o fascínio, a honra, o mistério, a curiosidade de conversar, de conhecer pessoas que me dessem de beber e de comer mas do outro lado… do outro lado há vampiros de almas como ela lhes chamou…. Sentem-se interessados, cativados como a traça pela chama, ao ponto de querer sugar-nos a alma e vestir-nos a pele, sim usurpar e já estás em terceiro lugar no ranking de pessoas que o tentaram fazer.

Confesso que não há mais do que pena e condescendência com tais indolências.

De uma delas, não guardo remorsos, era menina e fazia-o por imaturidade e descoberta, depressa percebeu o caminho certo, não foi por mal, não teve importância, perdoei e pronto.

Já aqui disse, e mais do que uma vez, que todos os disfarces, epítetos, alcunhas e demais floreados que uso por nomes, lugares ou demais vontades são meus e existem porque deles preciso e assim os criei à imagem e semelhança de seus originais donos, não porque fique bonito, misterioso, inteligente, laborioso ou porque me conceda uma certa aura enigmática mas porque, se se faz sem propósito algum, ou glosando o vizinho e ficando-lhe com os louros, é apenas medíocre e para além de medíocre é oco e também inútil e escrever coisas inúteis e supérfluas é ser-se supérfluo também.

Um amigo, que um dia descobriu este caderno medicamentoso, concluiu nada disto entender mas que provavelmente esse também não seria o propósito do escrito e que, todo este labirinto de palavras, seria decerto entendido por um alguém como língua materna.

Ora aí está, eu preciso de escrever, se não precisasse, não estaria aqui.

Não sou clara porque gosto de brincar com as palavras, porque me dá gozo usar os termos que cresci a ouvir na minha aldeia, porque me dá gozo criar teias de aranha propositadas, porque me traz conforto, porque adoro letras e porque, em último caso, é assim que sou.

Às vezes dou erros e volto para corrigir.

Às vezes o que escrevo tem destinatário, como as cartas, a maior parte das vezes sou só eu e os grãos de milho que se escondem por debaixo dos meus joelhos.

Às vezes escrevo sobre pessoas ou sítios, outras sobre o passado, outras sobre o passado outra vez e, muitas, sobre mim.

Tudo me faz sentido, tudo saiu daqui: destes dedos, deste cérebro e todas as linhas que escrevi desde dois mil e seis são-me páginas abertas e de todas elas sei onde estava, o que queria e do que falava, não escrevo para me ostentar e o que escrevo não impressiona e isso não importa porque não falta quem escreva, não falta quem saiba, não falta quem respire, não falta quem deambule.

Gosto das histórias aparentemente simples, frases e textos que se podem ler como se fossem aquilo que não são, Ágota e Kundera ou até os vampiros da Anne Rice.

Eu gosto de ser-me, gosto muito de ser eu e a isso não se pode fazer ctrl+t.

Gosto de ensinar, de dar a conhecer, de dar a mão mas odeio que me façam de idiota e detesto mostrar as minhas pérolas a quem só se interessa pelo seu brilho.

Tenho consciência de que muito do que escrevo é hermético e tenho consciência também de que muito do que escrevo, numa tentativa de escapar ao sofrimento, acabou por parecer bonito, acabou até por ser bem escrito mas é só isso e sinceramente não me importo, nem pouco mais ou menos.

Nunca foi por aí e nem nunca será e nunca é uma palavra bonita.

O vale fundo é a noite do começo foi mais uma página, bom, não foi mais uma página, foi a página que encetou este novo endereço.

Tentei fugir principalmente desses vampiros de sinónimos mas eles também se sabem transformar em nevoeiro e resvalar por debaixo da porta…

Não se é negro porque sim, é-se negro porque não há outra maneira de ser.

Encontra-se a negritude porque nos coadunamos com ela, porque assim somos, há dor e há sofrimento verdadeiro, não são apenas cigarros fumados para dar segurança, baralhos de cartas usados por vaidade ociosa, vermelho e negro e rosas porque ela gosta e ah e tal então é bonito, música sagrada que se empilha para mostrar o sofrimento e o trabalho que não foi nosso, nem caiu sobre nossas costas.

As bandas, os livros, as histórias surgem da vida a que se sobrevive, do trabalho que se odeia, da escola que se abandonou, das batatas que se ajudou a semear, dos incêndios que nos fizeram adensar as olheiras com medo de morrer queimado, das uvas que se vindimou, da erva que se cegou, das chapadas que se sentiu, das lágrimas que se engoliu, da fome que se acalmou com sandes de nada, da roupa que se imaginou e se improvisou, dos calos que se ganhou, do cabelo que protegemos desta vida pobre e desesperançada e que lavamos em água gelada porque não há quente.

E descobre-se o Manson porque tem raiva e desapego ao mundo como nós, e este leva-nos aos NIN que têm dores de alma que se carpem a menear a anca, embebidos em álcool de que o corpo já não aguenta pouco mais do que um copo, a Diamanda que nos diz, nos mostra a beleza de um rosto mediterrâneo, duro, com carácter, assustador por vezes, coisas negras, coisas feias que ficam por anos, que não se honra e gosta para se mostrar mas que se guarda e experimenta no quarto à luz de velas porque é ritual e ninguém compreende.

E há os finlandeses HIM que enovelam o amor e a morte adocicando o veneno para que não se tenha medo de o provar e que só lá pelo segundo gole nos dão a perceber de que é tudo menos seguro.

E os Nefilins que são sagrados e sagrados permanecem e nada há que escreva que lhes possa fazer jus.

Olha os Deftones! Que se encarnam e descarnam, porque tudo neles é carne.

Há Alcest de verde, azul e lilás floresta e magia e tudo isto remetendo para a mais pura e casta acepção das palavras usadas acima.

Haveria tantos e tantos, tantos que surgem de viver, de andar aqui neste mundo e recolher as pedras de quartzo que se metem ao bolso porque foram vistas pelos nossos olhos, ou ofertadas pelos que nos respeitam, não roubadas ou mostradas a outrem à mercê de pontos para subir mais um nível.

Aquele professor tinha razão mas como diz a senhora de negro, tudo se aninha, tudo volta ao lugar devido.

E já que nela falo, também posso mencionar de levezinho todos os que inadvertidamente me ensinaram e abriram portas, sem que eu lhes incomodasse o trabalho de ser.

A ela, a de sempre, a que começou tudo a Katrina, a madrinha do gótico, a gótica lusitana primeira, o Lord of Erewhon, ninguém escreve como ele, ninguém sabe o que ele sabe, pela primeira vez senti o quão alto se pode ser e mesmo assim deambular inocuamente pelas margens do Douro e o Goldmundo que me mostrou ribeiras de ser em palavras simples e pequenas.

Podia escrever e escrever e escrever sobre estas três reais personagens com quem muito aprendi mas será a primeira e última vez que as menciono porque sim e porque de onde venho não importa.

Não me apetece compartimentar o texto desta vez, é tudo assim e é tudo o que quero por agora. Despejar aquilo que já andava a remoer há uns tempos: a última erva daninha pois, infelizmente, as ervas daninhas gostam da minha terra, do meu pasto de nutrientes há anos!

Conheci mais destes vampiros do que dos vampiros existenciais ou libertinos das histórias mas já sou crescida e nada me mete medo que não sejam doenças e falta de dinheiro.

II

 

Oiço ††† e continuo a deleitar-me, ele diz que a composição no cd ficou demasiado polida em comparação com as demos mas eu não percebo nada de processos de gravação, ele é que é o músico, ele é que é o entendido.

A minha vida continua uma merda, a diferença?

Não me importo, não quero saber, pouco falo com os amigos e o que falo, confesso ser a maior parte por obrigação.

Não sei se é por estar apaixonada mas tudo se me mostra agora desnecessário, desinteressante e mundano.

E este estado de alma que sempre me perseguiu, este não sei quê, não sei porquê, vindo não sei de onde que me atormentava, tão sagrado quanto o Elizium dos Nefilins, tão sagrado como lírios, narcisos e violetas, encontrou ninho.

Isto é puro e raro e, Supremo, se te falasse de todas as coincidências que não são coincidências, do conhecer para além do tempo e dos receptáculos onde estivemos…. Mas não importa porque não interessa a ninguém mais do que a nós, ao resto só daria sono e aborrecimento, como me daria a mim se mo contassem.

E eu gosto assim, deste segredo e vivência que mais ninguém compreende, nem eu preciso que compreenda…. Faz anos daqui a uns dias, ofereci-lhe um pendente celta como ele gosta e escrevi-lhe muito e lacei com fita branca o que escrevi.

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                 

publicado por Ligeia Noire às 02:48
música: "Bi†ches Brew" dos †††
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