“We are like roses that have never bothered to bloom when we should have bloomed and it is as if the sun has become disgusted with waiting”.

29
Jul 14

 

07:45

 

Estou no quarto, sozinha, as cortinas não são opacas o suficiente para ocultarem a evidência da manhã que não quero aguentar, antes pelo contrário, são caramelizadas e transparentes.

Foram os melhores dias da minha vida, podia contar-te tudo mas não quero, foi um ritual de luz negra e vermelha de velas que só a nós pertence.

Cheiro-o em todo o lado, arrumo a garrafa de vodca polaca que o pai lhe ofereceu, a de sumo de maçã que comprámos numa pastelaria ao calhas (bolas, como ele gosta de sumo de maçã…) e a de água para o saco de lixo improvisado.

Ali está a toalha, ali, a um canto, deito-me na cama grande e tento dormir, não consigo, deito-me na pequena e fecho os olhos, durmo?

Se calhar dormi, não sei, não consigo respirar bem. Levanto-me um bocadinho, encosto-me à travesseira e fixo os olhos no vestido com que cheguei e que usei ontem também e que está, também, ali meio dobrado na cadeira, ainda deve cheirar a vinho verde branco fresco que nele foi entornado ontem, tenho de usar outra coisa… umas calças talvez, sim, umas calças e um casaco.

Está frio e nevoeiro, agradeço-te Supremo, agradeço-te pelo frio, preciso de acabar de fazer a mala, ver debaixo das camas, guardar os trocos na carteira, ir à casa de banho buscar o champô e a pasta de dentes… não me deixes pensar Supremo, olha, abrirei a janela e o ar matutino far-me-á sentir melhor.

Assim faço.

A vista é amontoada, grafitis por todo o lado, ah como os odeio! Aos rabiscos e a estas gaivotas que jamais se calam e que, em conluio com as melgas, me não deixaram dormir em condições.

Não penses, mantém-te ocupada.

Fomos ao alfarrabista do costume, não tinha os livros que procurava… levei a aparição por um euro, acho que o vou ler na estação, afinal de contas serão quatro horas de espera e preciso de escapar por um pouquinho que seja.

As lágrimas despontam outra vez, maldito sejas espaço e maldito sejas tu também ó tempo.

As gaivotas continuam o seu horrendo crocitar e o quarto parece-me uma masmorra, sinto-me a asfixiar.

Estou tolhida.

Amo-o e tento não pensar muito nisso para que os pulmões não se adelgacem mais… Quero ir embora deste sítio mas não quero ir embora na verdade.

Tenho medo e cheiro-o em todo lado.

Ontem, antes do jantar, não conseguia estancar o pranto, doíam-me tanto os olhos… Deveria brotar sorrisos borboleteantes e caricias doces mas ah Supremo… como me esmaga a dor da partida… sentia ali que não sabia ainda lidar com aquilo que sentia, quão pequena e marginal era eu perante tamanho tormento, tamanha abundancia de impossibilidade.

Ele, silencioso, pôs o telemóvel a carregar e foi tomar banho, tirei os sapatos, apenas, e deixei que a lingerie me constringisse enquanto me enrolava e fechava os olhos para que tudo ficasse bem.

Em cima da cama repousavam os discos que ele comprou umas horas antes e a caixinha vitoriana que me ofereceu, caixinha de madeira tão bonita… ao olhá-la vem-me à memória o entusiasmo da senhora comigo, com ele e com a nossa história. Embevecida contou-me sobre si e sobre a sua paixão por todas as coisas belas e delicadas que tinha na loja e de que eu também gostei muito. Perguntou-me coisas, apresentou-se, ah o sonho americano ainda, suspirou ela (ele zombou quando lho traduzi no caminho de regresso). Ele estava lá ao fundo com o marido dela, Alberto, assim se chamava o dono. O Alberto ia-lhe mostrando velhos leitores de vinil e máquinas de escrever, a esposa Maria mostrava-me nesse instante outra caixinha de madeira com arabescos na tampa e forrada a veludo verde, havia um baúzinho de madeira negra e floreados brancos mais bonito mas ela gostava mais da outra.

 Olhei-o enquanto este se deliciava com a máquina de escrever de teclas brancas que estava encostada à parede numa mesinha. A que a mãe lhe ofereceu de madeira envernizada, clara é mais bonita, mais graciosa, pensava eu.

Ele percebia que eu e ela falávamos dele porque mencionei o seu nome, sorriu em protesto. A Maria pediu que voltássemos lá um dia, assentei e sorri, ofereceu-nos os discos e só cobrou a caixinha, ah as aventuras! A vida que só se vive aqui e uma vez, arrematou com ar quimérico e saímos.

Tudo isto se me revolvia na tempestade que desembocava do peito ao cérebro sem precedentes, enquanto repousava inquieta e em profusão de cabelos.

Ele lia na banheira e eu sentia que ia morrer de sofrimento contido. Tão difícil se nos apresenta a tarefa de desviar a atenção do indizível. Não havia coisa alguma em que pudesse desaguar o pensamento e subsequentemente me fosse abrir as narinas e descansar o peito.

Abri a janela e deixei que o ar nevoeirento e nocturno me abraçasse um bocado e chorei outra vez. Sentia-me partida e infinitamente desolada.

Regressado do banho, deitou-se na cama grande, abriu o livro e continuou a ler, fechei a janela, tentei pensar nas coisas mais banais e aborrecidas de que me lembrava. Ele chamou-me, chamou para que me deitasse ao seu lado, o direito.

Fechou o livro, talvez tivesse lido apenas duas páginas. Era um livro de capa castanho-escura, grosso e volumoso, sobre as aventuras do Crowley na Alemanha, acho, não sei, apenas acho porque estava preocupada, triste e a respirar às metades.

Ajudou-me, pausou-me, protegeu-me, beijou-me, abraçou-me, salvou-me como lhe é apanágio.

Tentámos ver televisão para que o tempo que não queríamos que passasse, passasse porque o tempo tem de, tem sempre de… ir, mover, circular, tic tac, tic tac.

Filme aborrecido de meados dos noventa, filme que me fez lembrar daqueles romances de bolso à venda nas tabacarias. O sono ia puxando as pálpebras, ele foi descansar um bocado para a cama pequena,

O tempo de passar deve ter passado um bocadinho porque acordei sobressaltada com o toque do telemóvel, soergui-me e atendi.

Eram horas.

O coração esquadrinhou-me as entranhas, abracei-o e peguei-lhe na mala mais pequena.

A noite fria e aveludada pelo nevoeiro deu-me um arrepio inesperado, palavras curtas, beijo curto, abraço espartilhado.

Colocámos as malas na bagageira, ele voltou-se, dissemos até breve e abraçámo-nos.

Partiu, foi, ido.

Eu… eu fiquei ali, mesmerizada, arreigada ao chão, cheia de frio com um vestido de chiffon negro pejado de flores silvestres, renda e que ainda cheirava a vinho branco porque tudo estava arrumado e nada mais havia para vestir e, também, porque achei doce acaso ser o mesmo com que o recebi.

Chorei, cravei as unhas nas conchas das mãos e fiquei ali, assim de madrugada, sombria, enquanto um varredor de ruas observava e seguia o seu caminho ao mesmo tempo.

Subi, embrulhei-me na cama e as lágrimas alojavam-se, quentes, no pescoço.

Amanheceu, não sei se dormi, estou aqui e amo-o e estarreço-me, não por ama-lo mas pelo sortilégio que tudo isto é.

E falar do porvir, de rotinas ou pessoas… mareia-me e desola-me.

A tristeza que sinto é só minha e é triste.

Encontrei o filho-da-lua, desatei o laço branco e agora quero dormir, estar sozinha e não me mexer muito porque ele já não está e eu continuo, perduro-me.

 

I will take you away with me.

Once and for all.

Time will see us realign.

 

publicado por Ligeia Noire às 14:41

08
Nov 13

 

Sabes quando tu sabes que não mas mesmo assim dizes que sim?

Ora bem, lá vamos descendo as caleiras até à gruta pestilenta e, sem se saber porquê, deliciosa.

Há este projecto novo do Chino, ou melhor, projectos, Palms e †††, gosto mais deste último, tem canções simples e bonitas e apesar de me estarem a puxar as pálpebras continuo e prossigo neste continuar circular.

Deviam ser umas cinco ou seis horas da manhã porque me lembro de acordar e me lembro de me ter lembrado que tinha sonhado, acho que é essa a hora preferida do meu cérebro se deixar levar.

Sonhei com uma pequena cidade que pouco gosto e que parecia outra cidade na qual nunca estive, dentro de um autocarro que vinha de longe, estávamos nós, e havia muita coisa, eu estava no fundo à procura do meu guarda-chuva que não via em lado nenhum e só me apareciam roupas e mais roupas, rendas negras, desfeitas, atrapalhando tudo e tudo… estava ali uma das minhas, já não, melhores amigas, porque sim, nunca tive boa pontaria para as amizades, todas as que considerei confidentes estariam melhor do lado da linha vermelha, agora tenho amigos descomplicados e juntamo-nos para comida e bebida em dias de festa, não há mais dias de "ora senta-te aí e dá-me uma caneta que eu escrevo para ti umas linhas cheias de podridão, depois abraça-me e depois, ainda, haverá tempo para que te dê a chave e tranques tudo com a fechadura que comportamos nós".

Estava lá e eu também e havia coisas a acontecerem e não sei se era de dia ou de noite, era como se fosse tudo normal e eu como na vida do lado de cá, só queria encontrar o guarda-chuva, que acabei por achar, e vir embora.

Depois disso fiquei a olhar pro escuro e a pensar...

Agora é tudo maduro e crescido e nómada e torres de marfim ou então até queríamos ajudar e abrir o fecho para lhes vermos onde dói mas não há, de parte a parte, coragem, há só orgulho e lassidão e frases que terminam e acabam dentro de nós.

Estas canções feitas de cruzes estão a deixar-me mal, estão a querer que repense, que admita, que me volte na cama e feche os olhos mais e mais e eu não sei se dá, se volto, se sei voltar.

Deve haver esta imagem em muitos filmes, a da pessoa que se olha ao espelho e que sem falar nos transmite onde chegou…

Odeio que o tempo passe assim, odeio que chova assim sem tréguas, sem dias em que o sol fure as nuvens e eu possa, ao final da tarde, à hora do lusco-fusco, fugir por umas horas, sem destino, sentar-me, sabe Deus onde, e falar contigo Supremo, sem abrir a boca, pousar os olhos no laranja do sol a adormecer e apertar mais o casaco, mais os cordões, mais a trança, mais os braços.

Levantar-me, já sem saber onde estou, e desejar que não exista Mundo mas, depois, vem aquela estrela grande, lá ao fundo, que não sei de onde ou quando mas está ali e eu fico a olhar para ela e penso muitas coisas, como o facto de estar aqui e isso não ser muito importante, como o facto de o tempo passar assim, muito depressa, mas isso não fazer muita diferença.

Quero continuar a ouvir †††, quero continuar a sentir-me sozinha.

 

publicado por Ligeia Noire às 15:15
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16
Mai 13


Intro


Antes de tudo deixa-me bendizer o dia em que regressei ao Lost porque é soberbo, foda-se!

 

Ruminações


Eu, na verdade, não odeio ninguém porque quem não ama, não odeia, ou então gosto de toda a gente e odeio metades.

Estou certa de que desconfio de tudo e lembro-me daquele gajo que disse que mataria os pais, os filhos, até o puto de cinco anos do seu inimigo, sem remorsos mas, não o cão, o cão não teve escolha, os maquiavélicos e os seus soft spots por animais.

Podem ser uns desalmados desde que, para nós, deixem a alma subir aos olhos.

Não sei porque estou a escrever hoje, não estou triste, nem contente, estou aqui somente, sei que daqui por algumas semanas estarei cheia de medo, a semana passada estava em pleno jogo, agora estou aqui, volúvel mas inerte.

Talvez seja uma boa oportunidade para memorizar e ordenar a história do homem de tranças que conheci há uns anos, sim, faz-me sorrir pensar nele.

 

Baptismos concupiscentes


Era uma vez uma rapariga e a sua amiga que gostavam de se sentar afastadas no banco de madeira, quando o sol já sobrava da fotossíntese previamente feita, cognominando todos os indivíduos que lhes chamavam a atenção.

Engraçado nunca ter aparecido nenhuma rapariga que interessasse…

Havia o olhos-pretos-que-são-verdes, referíamo-nos ao gajo literalmente assim, era o James Dean lá do sítio, casaca de cabedal negro, calças de ganga, cabelo preto liso e ligeiramente comprido, uns dez anos mais velho, claro está. O nosso carácter voyeurístico só podia ser estimulado na hora de almoço quando ele fumava perto do lago, ou no sítio dos fumadores, como o pessoal chamava a um recanto ladeado por bancos de madeira e encimado por uma ramada.

Nunca falámos, quer dizer, mais ou menos porque uns tempos depois, na paragem para as férias de Natal, em que já nos encontrávamos no caminho para casa, ele passa por nós, abranda o carro e diz qualquer coisa que nunca chegámos a perceber, escusado será dizer que ganhámos o dia.

Muito mais tarde, já ele tinha acabado o curso, voltámos a vê-lo e, por incrível que pareça, foi numa loja bastante conhecida da zona, lembro-me como se tivesse sido ontem, estávamos na entrada e a nossa reacção, após um espanto desmesurado, deve ter sido um riso nervoso porque coincidências não existem.

Seguidamente, reparámos que ele acompanhava uma mulher já com uma pronunciada gravidez, o que foi ainda mais cómico.

Havia o nosso-menino, este era passível de devassidão da nossa parte porque era bastante mais novo do que nós, havia o caracóis... ah o coletinho por quem a minha amiga teve uma enorme paixão platónica. Chegou até a escrever-lhe uma carta que escondia debaixo da cama e que nunca chegou ao destino.

Ei! Quase me esquecia! O saltinhos... fumava cannabis e gostava de dias apartados para festas de trance privadas regadas a bombons pueris, tinha cabelo espesso curto, pele branca, olhos verdes e um ego altaneiro que de certeza provinha do peso do nome de baptismo que carregava.

Era amigo de um amigo nosso, no final de contas acabámos por descobrir que o nosso amigo era o nível acima e que este ser saltitante era apenas um narciso bem adorado

A última lembrança que tenho dele é de mão dada com uma amiga de uma amiga mas, também, já lhe havíamos perdido o interesse há muito.

Havia outro, quase no final da nossa estadia, não houve cognome individual para o dito, eles eram um grupo e o nome designava o colectivo, havia o que usava a t-shirt dos Bizarra Locomotiva, de cabelo grisalho e o semblante mais esquisito que já presenciei, mal eu sabia que havia de assistir a um concerto desses Bizarra e comprar-lhes o álbum negro uns anos depois.

Havia o amigo de cabelo agressivo, camisa bordeaux, ora preta, ora escocesa, calças negras, docs vermelhas ora pretas.

Aguava-se em mim a estética quando ele passava, era um colírio no meio de tanta monotonia, não seria gótico, nem punk, um intermédio talvez…

E o outro, o meu amigo, vi-o há pouco tempo num concerto, um pouco mais velho do que eu, bem… era mais do que um pouco, o que me atraiu nele… os piercings? As camisolas com desenhos animados? O ar de puto crescido? Ter filhas com a idade da minha irmã? Ou o flyer que ele me entregou daquele bar muito conhecido com o número e o e-mail no verso?

Estávamos na tasca do outro lado da rua, e essa tasca dava uma outra página... era um início de tarde langoroso porque tínhamos acabado o projecto final e já tínhamos o peso de tudo nos ombros e os olhos da saudade, fino leva a fino e vi-o ao fundo, do fundo da rua com o grupo dos que nomeei acima, ele inverteu a marcha e veio ter à mesa onde estávamos, para gaúdio dos meus amigos que levaram os dias seguintes a atiçar a língua.

Ficámos amigos, trocámos números, música, foi ele que me deu a conhecer Queens of The Stone Age, umas cenas de drum 'n bass e um músico tradicional brasileiro do qual não me lembro do nome porque não gostei.

Passeios ao início da noite, cervejas, ideias e depois houve aquela conversa à chuva, numa ponte por cima de uma linha férrea, beijámo-nos, pausei o beijo, depois não sei se não pude ir aos passeios do costume ou se ele foi embora, sei que nunca mais nos vimos até há um ou dois anos no tal concerto, foi estranho apenas.

O último, o trancinhas.

Já falei dele tantas vezes, este gajo foi o verdadeiro fascínio, era um bizarro, à parte de algumas maleitas físicas causadas por anos de drogas duras, era verdadeiramente belo.

Chamávamos-lhe trancinhas porque somos literais, gostávamos da imagem de marca das pessoas, daquilo que as identificava.

A este senhor, era simples, ele usava tranças, cabelos loiros e longos e finos e meios ondulados nas pontas, entrançados que ornamentavam os olhos azuis dum rosto preclaro. A primeira vez que o vi, estávamos longe, do outro lado do átrio, ele estava sentado na relva a enrolar tabaco avulso, parecia um guerreiro medieval, ficámos intrigadas e entusiasmadas. Ao vê-lo de perto nada tinha de bélico, havia um profundo ar silente de águas beiradas de juncais que era apenas perturbado por sorrisos infantis.

Que belo, sim.

Às vezes, punha um malmequer branco no meio das tranças e atravessava a cantina a assobiar, eu ficava fascinada.

Foi no bar do senhor de barbas e por culpa das minhas amigas que primeiro falei com ele. Vendo o meu entusiasmo foram pedir-lhe lume ao balcão, ele veio até à mesa, elas foram até à entrada fumar. Dessa conversa lunática, lembro-me de me ter convidado a colocar as palmas das minhas mãos nas dele e a fechar os olhos, não sei se era da tensão ou da estática mas senti verdadeiramente qualquer coisa de bizarro.

Foi ele que me leu Kafka no banco de madeira, na hora de almoço, foi ele que me ofereceu um disco de seu nome Born in Fire Vol.4, era um cd de metal extremo de uma editora holandesa, acho que a única banda que conhecia, e de nome, eram os Nile, não gostava do género mas guardo-o até hoje.

O pessoal gozava comigo, cantarolava mas ele era singular e por conseguinte tinha as suas singularidades.

Gostava de Radiohead, um dia veio até à minha porta emprestar-me um disco deles ao vivo, não me lembro qual era mas sei que tinha a morning bell, que eu ouvia sempre de manhã enquanto me vestia.

Às vezes, ligava-me e ria e depois eu só ouvia os acordes de uma guitarra e a voz do Kurt Cobain e quando a canção terminava ele desligava.

Foi ele de quem falei quando numa noite, depois de um passeio, nos convidou para jantar, sopa de meia-noite dizia ele, eu recusei, ele insistia e as meninas estavam na sacada preparadas para lhe lançarem, à cabeça incauta, os vasos da senhoria…

Eu sei que todos o achavam alienado, consumido mas ele descobriu coisas de mim que mais ninguém sabia, coisas que eu nunca lhe contei mas que sabia que ele sabia.

Acho que a última vez que falei com ele foi por telemóvel, era difícil acompanhar-lhe o raciocínio, perguntei-lhe quem era, perguntei-lhe tanta coisa…

Ele falou-me de uma namorada, da Holanda, (percebi de onde tinha vindo o disco onde estavam os Nile...) de empregos na Alemanha, disto e daquilo.

Ele sabia como me embaraçar, ele sabia que eu detestava que as pessoas olhassem para mim, o que era difícil quando ele de cabelos soltos caminhava pela cantina e se sentava na minha mesa e pescava do meu prato…

Nunca mais o vi, que será feito dele?

Ainda enlaço o cabelo com fitas, brancas às vezes.

 

publicado por Ligeia Noire às 23:33
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13
Dez 12


Conheço Pink Floyd como qualquer pessoa conhece Pink Floyd:


Comfortably Numb;


Wish you were here;


Another brick in the Wall (a parte dois, claro);


Já tinha experimentado há uns anos mas não, não estava preparada para descobrir a beleza sem passar pelo labirinto.

Darem-me, assim, coisas belas de bandeja é pedir que desconfie e eu desconfiei.

Por que me lembrei eu disto?

Bem, tudo começou com um cavalheiro de cabelos ruivos encaracolados e olhos azuis, pertencente a uma banda lá p'ra terra dos Bretões.

Já nem me recordo como descobri os Anathema, deve ter sido aquela ladainha das cerejas, mas para uma pessoa com o meu historial, já era mais certo do que corte de guilhotina, o tanto que me iam roubar o coração e das mais descaradas formas!

Esse cavalheiro ruivo é um músico que aprecio muitíssimo, desde os concertos acústicos que faz por aí com a dona de uma das mais belas vozes que já ouvi, a lindíssima, de todas as formas, Anneke Van Giersbergen, até à amizade com o escandinavo duplo v, chegando ao seu tesouro: os perfeitos Anathema.

Escusado será dizer que, aquando do mais recente concerto que por cá fizeram, delirei quando soube que lá iria pôr as patinhas.

 Na entrada para o recinto, qual não foi a minha surpresa quando vejo esse mesmo cavalheiro sereno e despercebido encostado ao autocarro de digressão, a ouvir música via auscultadores num desses aparelhitos modernos.

Ninguém na fila o tinha reconhecido ou se apercebido.

Mas como apreciadora de cabelos que sou, mesmo antes de lhe ver o rosto, já os cabelos me tinham chamado a atenção e, claro, quando levantou os olhos azuis e confirmei com os meus… foi mais um daqueles momentos docitos que qualquer apreciador profícuo de uma banda gosta de guardar consigo….

Ora, deixemo-nos de mariquices e continuemos, quando não estamos lá para degustar o nascimento de bandas que mudam o mundo, nem tudo está perdido, provámos da boca e mãos e alma dos que lá estiveram a magia toda.

É tudo uma constante fruição, lei de Lavoisier.

O cavalheiro em questão gosta mesmo muito de Pink Floyd, basta conhecer a música que faz para se perceber a extensão da cena… e foi assim que voltei ao caminho onde tinha deixado os senhores cor-de-rosa à espera.

Ainda sou uma menina muito, muito pequenina nisto mas já não lhes sei volver.

E, neste começar delgadito, comecei por aprender que há coisas bonitas que nem sempre estão no centro de um labirinto, embrulhadas em celofane.

Às vezes, estão ali, quais cerejas pendentes do céu, à espera que olhemos para cima e as colhamos.

O que é meu é muito meu.

 

Hello?

Is there anybody in there?

Just nod if you can hear me.

Is there anyone at home?

Come on, now,

I hear you're feeling down.

Well I can ease your pain

Get you on your feet again.

Relax.

I'll need some information first.

Just the basic facts.

Can you show me where it hurts?


There is no pain you are receding

A distant ship, smoke on the horizon.

You are only coming through in waves.

Your lips move but I can't hear what you're saying.

When I was a child I had a fever

My hands felt just like two balloons.

Now I've got that feeling once again

I can't explain you would not understand

This is not how I am.

I have become comfortably numb.


O.K.

Just a little pinprick.

There'll be no more aaaaaaaaah!
But you may feel a little sick.
Can you stand up?
I do believe it's working, good.
That'll keep you going through the show
Come on it's time to go.

There is no pain you are receding
A distant ship, smoke on the horizon.
You are only coming through in waves.
Your lips move but I can't hear what you're saying.
When I was a child 
I caught a fleeting glimpse
Out of the corner of my eye.
I turned to look but it was gone
I cannot put my finger on it now
The child is grown, 
The dream is gone.
I have become comfortably numb.

 

Lyrics by Pink Floyd/Letra da autoria dos Pink Floyd

 

 

Post Scriptum: that makes two of us, confortavelmente dormentes enquanto o Mundo decai.

 

publicado por Ligeia Noire às 15:10
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17
Jul 12


Não conseguia distinguir muito bem os rostos que se sentavam à frente, seria noite portanto.

Madrugada não, de madrugada voltámos nós: eu, a rapariga-que-tem-nome, o rapaz de óculos e o meu ex-namorado.

A estrada ia-se deixando usar, devagar, e o ponto b era a escadaria à luz da lua.

I’m not living I’m just killing time.

E, na viagem, o rapaz de óculos colocou a creep que, naquela altura, era o muito que eu conhecia desses senhores, embora, esta fosse a versão que consta no My Iron Lung, faixa oito e nem preciso de utilizar o Google para saber que estou certa, a acústica… só a voz e a guitarra… o que é que aconteceu?

Pedimos que voltasse a pôr e voltasse e voltasse até o rapaz do resgate de rapunzeis referir algo sobre o enfado…

Provavelmente chegámos ao destino e, acho que consigo desfechar sobre mim a memória da cidade lá ao fundo, a noite dava a ideia de existir um mar de chumbo a envolver-lhe as extremidades, nós sentados nas escadas… não, não estávamos sentados, já me lembro, estava frio, estava vento, a rapariga-que-tem-nome  ficou na escadaria com o rapaz dos óculos e eu estava na muralha, tentando com muita força ser uma donzela enamorada mas perdida ainda nas muitas coisas pequeninas que se aninhavam lá ao fundo.

Na verdade, eu queria estar com ela e ressuscitar a nossa tradição de, em momentos de pressão inabalável, ir a um sítio abandonado e escuro gritar a plenos pulmões.

Fazíamos, sim isso.

Gritávamos numa ponte por cima de uma auto-estrada que levava os muitos carros, carrinhas e camiões para a cidade do nevoeiro.

Voltando à escadaria, foi bonito, sim mas acho que o resgatador de rapunzeis não gostou muito da minha afinidade com o rapaz de óculos tocador de guitarra e degustador de música que não envolvia a usual movimentação compassada de cabelos que existem ou não.

Não gostou de que eu não fosse a usual rapariga que gosta das usuais músicas daquela usual tribo.

Quão cómico será dizer isto hoje, numa época em que a creep é considerada um erro (ai as pessoas analíticas) mas os erros deram frutos e os frutos sementes ou as sementes frutos.

E perguntei ao amigo se tinha mais alguma coisa da banda e ele disse que tinha tudo e mais alguma coisa.

E foram dias até ter tudo o que ele tinha e, literalmente, ter passado semanas, meses mergulhada naquelas canções…

Não era uma época muito tranquila, se te disser que estava triste, provavelmente irá soar a eufemismo.

Ter descoberto estes senhores, naquela altura, foi doentio e fez-me muito mal, tão mal que depois de meses mergulhada no negrume de carvões tive de deixar de os ouvir.

Como disse a menina ontem, são as depressivas que gosto mais.

Em raros, raríssimos momentos volto a limpar-lhes o pó, não são nem de perto nem de longe o meu cardápio mensal mas andam por aqui como se soubessem de uma espécie de segredo.

Se espera ou não, ainda não sei, ainda não passei a fase da existência.

Às vezes, pergunto-me como podem eles tocar sem desatarem a chorar…

Hoje estou com um vestido cor-de-rosa com o qual poderia dizer-te you and whose army?

Pois não chegues perto.


In pitch dark 

I go walking in your landscape 
Broken branches 
Trip me as I speak 

Just 'cause you feel it 
Doesn't mean it's there 
Just 'cause you feel it 
Doesn't mean it's there 

There's always a siren 
Singing you to shipwreck 
(Don't reach out, don't reach out 
Don't reach out, don't reach out) 
Steer away from each rocks 
We'd be a walking disaster 
(Don't reach out, don't reach out 
Don't reach out, don't reach out) 

Just 'cause you feel it 
Doesn't mean it's there 
(Someone on your shoulder 
Someone on your shoulder) 
Just 'cause you feel it 
Doesn't mean it's there 
(Someone on your shoulder 
Someone on your shoulder) 
There there! 

Why so green and lonely? 
Lonely, lonely? 

Heaven sent you to me 
To me, to me? 

We are accidents waiting 
Waiting to happen 

We are accidents waiting 
Waiting to happen

 

There there by Radiohead/Tema da autoria de Radiohead

 

E grandes rodas faz este vestido, de olhos que também olham como se soubessem de segredos.

publicado por Ligeia Noire às 11:01
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22
Ago 11


Tudo o que tem término, tudo o que é feito de fim, é bonito.

A vida é feia, com os seus acordes órfãos de maestro conhecido, dançamos descalços e em valas.

Já outrora falei da continuidade e do fim, tudo o que se prolonga, tudo o que tem movimento, tudo o que muta está condenado ao fracasso, à destruição.

O que é.

O que acontece.

O que termina, o que não nasce, nem cresce, continuará inatingível e eterno, no auge do seu valor.

 

Ô Satan, prends pitié de ma longue misère!

 

Acordei aterrorizada e olhei para o mostrador, passava um pouco das cinco da madrugada.

A respiração estava profunda, as unhas enterravam-se-me nas conchas das mãos e os olhos apertavam-se-me como botões novos.

Sim, mais um pesadelo.

Mais um bicho que se sentou nas minhas costelas.

Não me recordo muito bem do início mas lembro-me perfeitamente do sítio.

A ponte por cima da auto-estrada, com a serra ao fundo.

Seríamos uns cinco e não sei quem éramos, nem sei se eu estava lá, ou se pairava… como sempre.

Subimos uns degraus cavados na terra de uma encosta e estávamos, agora, na estrada.

Um deles falou e reparei que era uma mulher que trajava um manto com capuz.

No entanto, não me questionei porque nunca lhe vislumbrara o rosto.

Era como se fosse natural vê-la assim…

"Não sou religiosa."

Acho que foi isto que a ouvi dizer.

E não sei se continuámos o caminho ou se aconteceu logo.

A figura baixou o capuz e fiquei aterrorizada porque percebi que era Deus.

Não me perguntes porquê, nem como o sei mas é aquele mundo próprio dos sonhos, onde sabemos quem somos por indução.

Cá fora precisamos de cores, cheiros e feições, do outro lado, são sensações apenas e só.

O que sucedeu a seguir foi tão rápido, progressivo e pesado que o sonho se fechou para que eu pudesse acordar.

Nas mãos da figura estava uma longa foice que empunhou bem alto e com a qual colheu todos os corpos que ali estavam.

Os meus sonhos raramente têm cor.

Posso quase lembrar-me de todos os sonhos a que a minha cabeça conferiu cor, quase sempre vermelho.

Flores, lábios…

Mas, neste, a cada corte o sangue abria-se em leque, tão vermelho como cerejas, tão vermelho como sangue ainda quente e ainda vivo.

Se eu estava ali ou se estava apenas como espectadora, não sei, o que leva a que desconheça se também eu fui morta.

Não posso dizer que os pesadelos voltaram porque acho que jamais se foram.

Ouvi um médico dizer que sonhamos, invariavelmente, todos os dias, mas que nem sempre nos lembrámos.

publicado por Ligeia Noire às 14:57
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07
Abr 11


Instintivamente, acho que acabei por fazer aquilo que outrora me aconselharam, aprender com os gatos e não confiar em ninguém.

Todavia, ainda não fui buscar as palavras para lapidar esse assunto.

Enquanto a cabeça rodopia e rodopia em valsas continuadas, lembro-me que não tenho tido comportamentos de ser humano, há muito tempo.

Hoje está calor, a noite está quente, fui passear-me e raptar umas flores mas o tempo continua enferrujado.

 

Pessoa A


Eu também quero estar contigo, quero ver o que vai suceder, quero saber se fazes parte do sangue, quero saber se sinto tudo ou se o tempo e a lonjura foram ceifeiros das nossas vontades.

 

Pessoa B


Cada vez que vejo algum bocado do meu Frankenstein, lembro-me que ainda pertences. E, enquanto escrevo, vens para ao pé de mim e é bom.

És tão diferente de todos, acho que jamais deixarei de gostar de ti.

Simples.


Frankenstein


Fundamentalmente, és uma aberração e não me parece que o Supremo te deixe existir aqui... mas hoje vi-te umas brechas.

Como se o teu mundo andasse no meio do meu, atravessaste a rua e tive de continuar para a masmorra.

 

Trasladação


As minhas mãos hoje cheiravam a aguardente, já os olhos andaram o dia todo desmaiados.

Na noite pairava açúcar, estou enjoada, nauseada, cansada e maltratada.

Sinto falta daquele quarto com duas camas, uma mesa-de-cabeceira, um guarda-vestidos e uma varanda.

Sinto falta da sua neblina de haxixe e uns tantos pós cândidos e éteres maléficos.

Sinto falta das garrafas que pesavam na mesa, sinto falta de transviar pessoas, sinto falta de ti, rapariga-que-tem-nome.

De todos foste a mais bela, a totalidade, o fogo e o gelo, a loucura, a trindade.

Para ti, lembras-te?

 

O mar em Fevereiro


Éramos ainda o que somos.

E tenho saudades de saber ser o que fui.

Eles, que nos acompanhavam, não nos sabiam.

Talvez esperassem comer-nos a carne mas temo que ela fosse demasiado extra-sensorial para os seus dentes e língua de leites mornos e de pacote.

Éramos leite ainda no úbere.

Éramos rosas selvagens e suicidas de tão vermelhas.

E levaram-nos para o mar.

Fazia frio, a noite estava de veludo e o céu, vestido das suas mais formosas estrelas, ondeava.

Tirei o casaco negro, as botas e olhei calada, tu olhaste calada.

"Vamos?" e sorriste como só tu sabes.

Os teus sorrisos dos olhos e da boca são só teus.

Acharam-nos dementes mas que diferença fazia, não nos achavam já?

Estavas tão liberta e tão perigosa.

O mar provou-nos o corpo inteiro até ao êxtase.

Tu rias e ias mais longe, lembras-te do rapaz engraçado?

Ele acabou por se juntar à celebração.

A minha camisa branca, a camisa do Crisma, a mesma que me cobria o peito quieto.

Tinha o cabelo inundado, as calças ensopadas e a camisa virginal tinha sido assolada pela água gelada.

O corpo sabia a sal e a lua terna.

Lembras-te do outro rapaz?

Aquele para quem deveria exibir o meu olhar e a minha compleição de enamorada?

Estava sentado na areia de olhos incompreensivos.

O mar jamais lhe provaria a pele mesmo que ele se tivesse afogado nele.

Podias ensinar-lhe o perigo, o gosto, a liberdade de não ter corpo, de não ser deste mundo, talvez assim eu o quisesse.

E riste, tu riste quando me viste a sair da água em direcção ao rapaz irritado que se plantava como junco nas conchas.

Tu rias porque me sabias e eu dizia-te "sim" sem falar.

Há poucas coisas que me assustam e há poucas coisas, aliás, muito poucas, que me amansam e depois, depois há ainda menos coisas que me dão gozo, que me enleiam o espírito.

Gosto de brincar.

Tenho-me medo, aos outros não, os outros são extra-compreensão à qual não me entrego.

Como a loucura não chega para todos, o rapaz (que sempre me fez lembrar aqueles cavaleiros que necessitam de resgatar Rapunzeis mas que na sua senda existencial, se esquecem de que a gaja não quer ser salva porque a salvação é como ver as soluções no final do livro) olhava-me zangado.

Estaquei-me à sua frente, a camisa pingava-lhe pequenas gotas salgadas nos pés calçados e os olhos pousavam-me no corpo, que se transparecia.

Deixei o meu peso pesar-lhe no colo e fechei-lhe as mãos nas minhas.

Não se lhe ouviam palavras, beijei-lhe a boca.

Ele era fome e intenção, deu-me a mão e pediu que o acompanhasse na sua contemplação amorosa mas corri para a prata e ele não quis tirar as botas.

Quando olhei para trás, já estava longe, nas rochas. 

 

I'm Looking Forward To Joining You, Finally

 

As black as the night can get

everything is safer now
there's always a way to forget
once you learn to find a way how


In the blur of serenity
where did everything get lost?
the flowers of naivet
é
buried in a layer of frost

The smell of sunshine
I remember sometimes

Thought he had it all, before they called his bluff
found out that his skin just wasn't thick enough
wanted to go back to how it was before
thought he lost everything
then he lost a whole lot more

A fool's devotion
swallowed up in empty space
the tears of regret
frozen to the side of his face

The smell of sunshine
I remember sometimes


I’ve done all I can do
could I please come with you?
Sweet smell of sunshine
I remember sometimes


Lyrics by Trent Reznor/Letra de Trent Reznor


Voltámos os três e fomos descalços em direcção a um rol de palavras azedas.

Percebi, naquele instante, de que não valia de nada fazer força, tentar... e ri, ri e ri contigo, filha da Estrela-da-manhã, e fomos livres e anestesiadas e salgadas como carne vermelha presa pelo ápice à vista de todos.

Subir ao teu cavalo rapaz, foi como beber água inquinada deliberadamente.

Quiseste a boneca e a caixa...


publicado por Ligeia Noire às 22:20
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15
Fev 10


Quando vens, todas as brechas se preenchem.

Como se ingerisse dimetiltriptamina passo para o teu lado, aí onde descansas, até que todos nós tenhamos os olhos abertos.

Às vezes, a linha fica tão ténue que te sinto excessivamente cá dentro, até doer de sufocação.

Mas quando fico assim, tão inerte, tão por ti perfeita, não há nada que me atormente, nada que avassale o meu estado letárgico.

Não existem pessoas, nem coisas mundanas que somente de as pensar conspurco estas linhas que te escrevo.

Há coisas que estão destinadas a acontecer e acredito que quando souber o que há aí irei conseguir falar a tua língua e ver-te os olhos.

Aquela noite de bancos frios.

Aquela noite na cidade perdida onde me fechei e inalei a treva.

Talvez tenha atravessado… talvez tenha realmente atravessado.

Por que é que tudo o que quero não existe?

Por que raio tu não existes?

Não quero procurar mais… não quero, senão os teus cabelos longos, os teus olhos de portões seculares e as tuas mãos de serafim.

Não quero prosseguir com a vida cá em baixo.

O peito está constrangido e às vezes respiro-te tanto que preciso de tempo para respirar.

Apareces assim… apareces do nada e sinto-te eterno e enraizado em tudo o que sou.

De onde vieste tu que ninguém vê senão eu?

Tu és e eu ainda não me sou.

Ó Sagrado Cavaleiro do Escolhido, não me abandones!

Leva-me e esconde-me num lugar onde não haja tempo.

  

publicado por Ligeia Noire às 12:56
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14
Jul 09


A chuva não cai.

Há sol.

Não há vento.

Não está frio.

Está calor.

Não é dia, é noite velada.

A casa está vazia.

O quarto está vazio.

Ela está.

Ela nunca cessou.

Se foi, não dei por nada.

Onde estavam?

Não sei.

Para onde foram?

Desconheço.

Se te conheciam?

Não entendo o plural?

Existiu o batom.

O lápis preto.

As tranças que esperavam ser desfeitas.

Ainda esperam.

A roupa no corpo.

O quarto arrumado.

O cd toca.

Não há vontade de comer.

Os collants.

As pernas.

Os collants primeiro nas mãos, depois… pele.

Descalça.

O azulejo, ora frio, ora gelado.

O espelho.

A menina intragável.

Não há plural.

Não há garganta fresca.

Não há corpo calmo.

Há alma descida.

O corpo deixou a roupa.

O corpo e o debate pela quietude dentro da cabeça.

O cd continua às voltas...


publicado por Ligeia Noire às 18:22
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